Más notícias: as mulheres continuam submissas! De nada adiantou a propalada revolução sexual, a queima de sutiãs em praça pública, a difusão da pílula. É como se quiséssemos continuar como as eternas representantes do “sexo frágil”, a quem tudo se impõe. Mudamos muito, mas mudamos para continuarmos as mesmas. O que há de ruim nisso? Há um fato novo e quase imperceptível para a maioria de nós. Trocamos a dominação de pais, maridos e patrões por outra, invisível, e por isso, mesmo mais perigosa. A dominação da mídia e da publicidade. É ruim e até pior, pois diariamente enfrentamos a tarefa de ter de ser eternamente jovens, belas e sadias. Não há prisão mais violenta do que aquela que não nos permite mudar. Que nos bombardeia com imagens de eterna juventude, nos doutrinando a negar as mudanças.
Como envelhecer, quando tudo que nos cerca — o outdoor, a televisão, as fotos na revista — é construído de forma a negar o envelhecimento; envelhecimento definido, em nosso tempo, como sinônimo de perda? Os sociólogos têm denunciado o fato de que vivemos um terrível paradoxo: a possibilidade oferecida de, enfim, prolongar seus dias é vivida como algo de negativo. Moldada em torno de valores como o progresso e a juventude, nossa sociedade lida mal com o número crescente daqueles que, envelhecendo, beneficiam-se de um alongamento sem precedentes da esperança de vida.
Os efeitos dessa constatação entre as mulheres é perverso. Em sua grande maioria, investem tudo o que podem na aparência exterior. O modelo de Giseles, Xuxas, Veras parece não deixar opção. Não há limites para continuar magra, turbinada e vitaminada. As cirurgias plásticas, no entender de uma conhecida atriz, tornaram-se uma questão de “higiene”. O silicone nos seios substitui, como explicou saudoso, um comediante, o “tradicional leitinho”. Ora, a identidade corporal feminina está sendo condicionada não pelas conquistas da mulher no mundo privado ou público, mas por mecanismos de ajuste obrigatório da tríade beleza-juventude-saúde. Leia-se: a mulher deve explicitar a beleza do corpo por sua juventude, sua juventude por sua saúde, sua saúde por sua beleza.
Pode não parecer evidente, mas as relações que temos tido com nossos corpos revelam o tipo de identidade que estamos construindo. As revistas femininas nos ensinam que vivemos um momento ideal de “otimismo”. “Que idade? Jovem!”. O anúncio acompanha o produto anti-rugas com o rosto sorridente da mulher de idade indefinida. A foto resume bem essa disposição para fazer com que a idade madura pareça o fim da história. Nada existiria depois dela. Nem mesmo aquele país cinza, da cor da cabeça de nossas avós. A mídia, por sua vez, cauciona essa tese sem pudores. Argumentos publicitários, produtos de beleza e medicina vulgarizada nas revistas são os mecanismos sutis, mas extremamente repressivos, que agem sobre o corpo feminino. Bom seria começar a ter uma posição crítica em relação a esses discursos. Discursos tão mais perigosos quanto aderem de maneira sub-reptícia a nosso cotidiano fazendo-nos confundir sua normalidade com banalidade. O que estamos esperando para começar a reagir?
– Mary del Priore
“Vênus no espelho”, de Velasquez.
Ótimo texto que você escreveu. Parabéns Mary.
Eu infelizmente fui vítima dessas amarras que atingem nos mulheres. As próprias revistinhas que eu lia Capricho e João Bidu, influenciaram e de algum modo queriam-me calar.
Aos 13 anos eu tive Bulimia. É, um livro que me ajudou bastante a atender que nós somos vítimas, e não culpadas por não ter um corpo “perfeito”, perfeito aos olhos da mídia, foi A Ditadura da Beleza e Revolução da mulheres, apesar de o autor Augusto Cury escrever livros mais de cunho de auto ajuda. Foi através dele que pude compreender o que aconteceu comigo, e adentrar também no universo feminino. Foi através dele que comecei a me interessar mais sobre nós mulheres, lendo Simone Beauvoir, e os seus textos e livros também Mary. Também me interesso em ler sobre as mulheres do Oriente Médio.
É interessante perceber o caminho percorrido por nos mulheres, e os caminhos que ainda temos que percorrer para adquirir uma liberdade plena.
Show de bola, essa análise!
Com base na leitura que fiz do livro “História do Amor no Brasil” percebi que apesar de tantas mudanças, de termos hoje mulheres em diversos setores da sociedade, setores esses dominados antes pelos homens, ainda encontramos em nosso cotidiano mulheres totalmente submissas ao homem, aquelas que ainda estão em casa, apenas para cuidar dos filhos e dos afazeres domésticos. Ou seja, em pleno século XXI ainda não nos livramos dos preconceitos e da visão da mulher como “objeto” de servir ao homem.
Perfeito esse artigo, Mary. Acho que não só as mulheres vivem essa histeria. Os homens também estão aderindo.