As mulheres e o amor

Hoje, com ou sem marido, com ou sem família, um único assunto ocupa as mulheres: o amor. Sinônimo de felicidade, esse sentimento é a principal razão pela qual elas ocupam os divãs. Mulheres querem ser amadas. Como bem diz Bernardo Jablonski, vigora a máxima soberana: Só o amor constrói. Ele diz também que vivemos em meio a uma cultura que valoriza extremamente a importância do amor e da paixão, envoltos em uma visão “hollywoodiana” da afetividade. O que as jovens aprendem por meio de maciça doutrinação – via cinema, novelas, músicas, jornais e anúncios publicitários – é que o amor é a chave que abre as portas do paraíso na terra.

Faz parte desse pacote a ideia de que um dia as mulheres encontrarão um príncipe encantado com todas as qualidades da alma gêmea. Então viverão felizes para sempre, imunes a icebergs como os que afundaram o Titanic! E nada de sapo, que é preciso beijar para transformar em príncipe, mas um prontinho: o príncipe prêt-à-porter.

Segundo psicanalistas, a sociedade passou a criar uma expectativa difícil de ser alcançada. O casamento não é um mar de rosas e há um problema demográfico: mais princesas do que príncipes – o IBGE revela desníveis enormes entre o número de mulheres e o de homens. Eles se tornaram coisa rara, mesmo os sapos. Pesquisas revelam que, embora considerado prioritário para manter os casamentos, ao longo do tempo, o sentimento amoroso é substituído entre os mais jovens por “companheirismo, confiança, sexo, comprometimento, comunhão de ideias e sorte”. Acima de sessenta anos privilegiam-se “estabilidade e segurança financeira”.

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Apesar das crises, existe atualmente um movimento com tendência a observar que o sucesso da união não cai do céu. Ele decorre da valorização de um compromisso em longo prazo; de uma expressão que, segundo Jablonski, entrou na moda por intermédio de revistas e reportagens: “investimento na relação”. Uma relação satisfatória resultaria do exercício cotidiano de pequenos gestos, surpresas, respeito mútuo e amizade.

Detalhe: acabou? “Não é que não tenha dado certo. Deu certo enquanto durou”. Ora, no século XXI, o amor parece cumprir a receita dada, cinquenta anos atrás, pelo poeta Vinícius de Moraes: “que não seja eterno posto que é chama, mas que seja infinito enquanto dure”.  Não é mais obrigatório engolir sapos para “não perder seu homem”. Nem príncipes!

Psicanalistas observaram também que, no início do século XXI, a questão da sexualidade entre homens e mulheres mudou, mas não tanto. Muita coisa continuou como dantes no quartel de Abrantes, ou seja, como antes da revolução sexual dos anos 1980. Sim, os homens passaram a se preocupar com a satisfação das parceiras, com maior liberdade de carícias e posições. Passaram a aceitar também que a busca do prazer é algo desejável, e o orgasmo feminino passou a existir.

Porém, traços do passado, as permanências, subsistem. Exemplos: em 2011, à pergunta Você se casou virgem?, 98% dos homens diziam não. As respostas femininas caem para 42,5%. O tabu da virgindade perde força, mas está longe de acabar. Outra questão: Você manteve relações sexuais fora do casamento? Entre os homens, o nível de traições é de 50% contra 13% das casadas. A dupla moral masculina ainda sobrevive. Um terço das entrevistadas declarou não ter orgasmo nem desejo sexual. No item Frequência das relações sexuais, homens demonstraram ter mais do que mulheres. Filhos seguem como importante barreira para o fim do matrimônio; casais que não os têm se separaram mais. Falta de coragem, entre elas, e sentimento de culpa, entre eles, são explicações para ficar juntos. Resultado? Frustrações, rancor, desânimo, autoestima baixa e… insatisfação.

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Miriam Goldenberg concorda. Homens e mulheres estariam falando linguagens diferentes – como se homens falassem a de Marte, e as mulheres, a de Vênus. O desentendimento, contudo, leva a conclusões apressadas. Se tudo parece não ter mudado em nada, ao contrário, encontramo-nos em uma fase de transição – o que talvez explique por que as pessoas continuam se casando, sem temer as crises conjugais.

Mas eis que a linguagem feminina se impõe: elas querem viver o amor-paixão. Se algumas décadas atrás o amor não era importante, ou visto como algo a ser desenvolvido, o que se pretende hoje é o casamento apoiado num sentimento abrasado, idealizado e, na maior parte das vezes… efêmero.  – Mary del Priore

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“Henrique IV cumprimentando Gabrielle”, de Nicolas-Antoine de Taunay.

2 Comentários

  1. Flávia Guimarães

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