FAZENDO HISTÓRIA COM QUADRINHOS

Por Natania Nogueira.

Você já leu uma história em quadrinhos?

Acredito que sim, em algum momento da sua vida.

Você sabia que quadrinhos podem ser usados como fonte de pesquisa em várias áreas do conhecimento?

Provavelmente não, mas nos últimos 20 anos vem crescendo o número de pesquisas e de pesquisadores que se interessam pelas Histórias em Quadrinhos, vistas como um instrumento de ensino nas escolas, em todos os níveis, ou como uma fonte ainda inexplorada de informações e representações de uma determinada época.

Dentre os muitos pesquisadores que tem se dedicado a utilizar os quadrinhos como objeto de pesquisa estão os historiadores. Nos Estados Unidos esses Historiadores dos Quadrinhos levam esse ofício muito a sério e existem até museus e arquivos virtuais que disponibilizam material publicado desde o início do século XX para leitura.

Embora os Estados Unidos não tenham necessariamente inventado as Histórias em Quadrinhos eles as tornaram um meio de comunicação que ultrapassou fronteiras. Existe todo um mercado que gira em torno da sua produção que, atualmente, extrapola o produto original em si. Elas invadiram o cinema, a televisão, as lojas de brinquedos e até de vestuário. Personagens como Snoopy, Mafalda, Superman e Tintin se tornaram quase universais, conhecidos em várias partes do mundo. Como uma indústria, os quadrinhos se tornaram um sucesso no decorrer do século XX, como produto ideológico eles levam valores e disseminam ideias e preconceitos dos países que os produzem.

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Uma grande referência na indústria dos quadrinhos do século XX, Will Eisner definiu os quadrinhos como uma forma de artesequencial, ou seja, uma forma de narrativa que utiliza imagens em sequência. Mas arte sequencial é um termo abrangente, que envolve todas as formas de narrativa sequencial por meio de imagens como, por exemplo, o cinema e a animação.

As Histórias em Quadrinhos são uma forma de narrativa que pode usar imagem e texto e onde o leitor precisa interagir com as informações a ele apresentadas para decifrar o significado da narrativa. O texto nem sempre é necessário, pois as Histórias em Quadrinhos podem ser construídas tão somente por meio de uma disposição de imagens em sequência deliberada. Além disso, elas são um produto da era industrial e do avanço dos meios de comunicação. Como produto cultural, elas representam um registro específico de um dado contexto histórico.

No Brasil, a pesquisa utilizando Histórias em Quadrinhos vem avançando a passos largos e ganhando espaço nas universidades.  A cada ano, ocorrem novos encontros acadêmicos, surgem novos grupos de pesquisa e até associações voltadas para a pesquisa em arte sequencial. Sendo uma mídia que é traduzida e reproduzida em vários países, os quadrinhos possuem um conteúdo ideológico que reflete valores de quem os produziu e o contexto onde foram produzidos.

Essas histórias, publicadas em jornais ou revistas, podem fornecer elementos importantes para o estudo de períodos da história dos séculos XIX e XX. Não apenas o produto, como também que o produz e quem o consome podem ser colocados sob análise, contextualizados e se tornarem referências para os mais variados estudos, por exemplo, em História Cultural.

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No Brasil, a produção de quadrinhos, charges e caricaturas já é uma fonte utilizada para estudosdo século XIX, quando jornais e revistas ilustradas abundavam nas cidades do Império. No século XX, essa produção não foi menos representativa. O maior nome das Histórias em Quadrinhos Brasileiras foi Angelo Agostini que, em 1869, publicou na Revista Vida Fluminense“ As Aventuras de Nhô Quim ou Impressões de Uma Viagem à Corte”, considerada a primeira História em Quadrinhos Brasileira e uma das mais antigas do mundo.

As Histórias em Quadrinhos estão longe de ser uma forma de lazer inocente que seus filhos consomem. Elas, na verdade, são produzidas para todos os tipos de público e para as mais diversas finalidades. Agora com a aproximação das eleições, por exemplo, não vai ser difícil encontrar revistas em quadrinhos contando a história de partidos e candidatos, a serem distribuídas gratuitamente, direcionadas aos eleitores e recheadas de conteúdo político-ideológico.

Assim, devemos e precisamos pensar nos quadrinhos como uma forma de registro. Como um documento, mas não apenas isso, mas como um depositório de informações que interage com seu leitor tal como um livro e, em muitos casos, em uma escala muito mais ampla, atingindo um público muito mais vasto.

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“As aventuras de Nhô Quim”, personagem criado por Angelo Agostini, contava as aventuras de um caipira em visita a corte no Rio de Janeiro.

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SUGESTÕES DE LEITURA:

GONÇALO, Júnior. A Guerra dos Gibis: a formação do mercado editorial brasileiro e a censura aos quadrinhos. – São Paulo: Companhia das Letras, 2004.

BALABAN, Marcelo. O poeta do lápis – sátira e política na trajetória de Angelo Agostini no Brasil Imperial (1864 – 1888). – Campinas: Editora Unicamp, 2009.

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