Tivemos um ano difícil. Instabilidade política, crise econômica, intolerância. Tragédias, como a de Mariana (MG), um “desastre” ambiental sem precedentes no país. E as dificuldades não foram exclusividade do Brasil: o mundo todo sofreu com problemas econômicos, terrorismo, guerras, atentados, perseguições. Radicalismos políticos e religiosos vitimaram milhares de inocentes. Refugiados morreram em busca de um lugar seguro para viver. A xenofobia se tornou mais forte. Em meio a todo esse caos, observamos que as mulheres estão dispostas a ocupar o seu espaço.
No Brasil, tivemos avanços e retrocessos. A aprovação da lei do feminicídio é um exemplo positivo. Em contrapartida, foi apresentado um projeto de lei que restringe a indução ao uso de “medicamentos abortivos” em caso de estupro e determina que as mulheres vítimas de abuso sexual precisariam passar por uma delegacia antes de receberem o atendimento médico. O texto causou muita polêmica, pois, na prática, pode dificultar o acesso à pílula do dia seguinte (que não é considerada abortiva pela ciência). Sem falar nas dificuldades que cria para as vítimas de estupro e violência sexual.
Inconformadas com o retrocesso que esse projeto de lei poderia causar, milhares de mulheres saíram às ruas para protestar contra ele. E também contra o autor do PL, deputado Eduardo Cunha, que representa a ala mais retrógrada do Congresso. “Pílula fica, Cunha sai!”, foi a tônica desses atos. Nessas marchas femininas, pudemos observar que havia outras demandas envolvidas: liberalização do aborto, combate à violência contra a mulher e muitas outras questões importantes para o país. Foi um grito contra a opressão e o machismo.
Trabalhadoras rurais, indígenas, extrativistas e quilombolas também mostraram que querem seu espaço na sociedade. A 5ª Marcha das Margaridas, em Brasília, demonstrou que as mulheres irão marcar sua posição política e fazem questão de participar ativamente das decisões que as afetam como cidadãs. Obviamente, essas iniciativas foram acompanhadas de muita resistência. Procura-se, a todo custo, desqualificar as reivindicações das mulheres. Os incidentes são noticiados com lente de aumento, com a clara intenção de diminuir a importância dessas manifestações.
Pela primeira vez, o Brasil é governado por uma mulher. Infelizmente, isso não significou um incremento real das políticas públicas para as mulheres. Houve apenas algumas iniciativas tímidas e pontuais, na minha avaliação. Independente da preferência política de cada um (não discutimos política partidária nesse blog) e da avaliação pessoal do desempenho da presidente Dilma, é inegável que a misoginia tem mostrado a sua cara mais assustadora durante o seu governo. Não se trata de aprovar ou não seu governo, seu partido ou até sua pessoa.
Com a popularidade em baixa, xingamentos machistas, observações maldosas sobre sua aparência e forma física, e até especulações sobre sua vida sexual (uma revista de grande circulação publicou um artigo sobre isso) contaminaram as críticas e protestos em relação aos seus méritos como governante e política. Enfim, isso nos mostrou que, apesar dos avanços, a misoginia é um traço marcante de nossa sociedade. Os números impressionantes de estupros e violência doméstica são outra prova disso.
As mulheres, contudo, mostraram sua capacidade de reação e de organização, representando – ao lado dos estudantes secundaristas – um dos fatores mais importantes do cenário político e, por que não?, do intrincado tecido social brasileiro. O nosso poder de organização e nossa resiliência nos fazem cada vez mais fortes.
Um feliz ano novo para todas nós! – Texto de Márcia Pinna Raspanti.
Fotos: Jornalistas Livres.
Parabéns por desempenhar um trabalho que nos faz refletir sobre as questões do cotidiano. Amo, sobretudo, os textos em que o feminismo é abordado.
Obrigada, Amanda. Feliz 2016!