Nessa época do ano, é impossível escapar à tentação das previsões. Afinal, desde a pré-história, o homem não deixou de querer conhecer o futuro e de dominá-lo. Das técnicas de adivinhação inventadas pelos povos da Antiguidade aos métodos “científicos” elaborados por técnicos, os meios de predição variam: astrologia, leitura da borra de café ou cartas, até por Internet. Pouco importa. Cada época tem necessidade de sonhar com um amanhã: melhor ou pior. Oráculos, profecias, predições, utopias, todas as antecipações que os homens construíram, no decorrer da história, não se realizaram. Mas elas são reflexos de suas esperanças e crenças.
Um poeta disse que para ser profeta, bastava ser pessimista. Já na metade do século XIX, havia quem escrevesse sobre um mundo futuro mecanizado, sem ideias espirituais, vivendo ao ritmo das crises econômicas e ameaças de guerra. Nessa época, Nietzche, filósofo hoje na moda, escreveu que a felicidade não era importante. Só a sua procura. Outros achavam que o fatalismo seria o maior adversário da ação. Ninguém se mexeria, deixando tudo “rolar”.
Marcados pela primeira Guerra Mundial, muitos pensadores fizeram coro ao pessimismo. Freud contestou a noção de progresso e supôs a existência de um instinto de destruição. Os surrealistas desenvolveram a ideia do absurdo das coisas e não faltou quem visse nas marcas do tempo, o anúncio do fim de tudo, como o filósofo Wittgenstein. Ou uma caminhada na direção do sofrimento, como predisse o escritor George Orwell. Boa parte desse pessimismo se enraizava na tomada de consciência de uma distância crescente entre progresso técnico e progresso moral. Para solucionar essa pendência, em 1971, o Clube de Roma reuniu uma elite de pensadores. Conclusão? O grupo anteviu que o crescimento demográfico e econômico provocaria uma catástrofe e uma crise ecológica, sem precedentes, em meados do século XXI.
E nós ainda acreditamos em previsões? Acho que se os brasileiros mudaram, foi no sentido de não acreditar mais nelas. Deixamos para trás a atitude infantil de insistir em sonhos que acabam em decepções. Ou de crer em falsas promessas. Nunca o futuro foi tão misterioso quanto nesse início de século XXI. Nenhuma máquina de previsão conseguiu explicar a complexidade do mundo atual, onde tudo se confunde, onde realidade e espetáculo se misturam, valores e ideologias desmoronam, tudo se desencanta. Aquecimento do planeta, desastres climáticos, aumento do nível dos oceanos, fim das florestas, fome, corrupção em toda a parte, empobrecimento dos mais pobres, enriquecimento dos mais ricos, enfim, a lista é longa. A resposta, talvez, esteja em fugir das previsões de futuro e jogar no presente. Vivê-lo com delicadeza e investir nos pequenos prazeres. Fórmula excelente para enfrentarmos o apocalipse, como querem muitos. Ou o paraíso, como esperam outros. – Mary del Priore