Até o século XIX, o número de escravos que uma pessoa possuía era considerado pelos brasileiros um forte indicador de nobreza. Os viajantes europeus que passaram por aqui costumavam ficar espantados com a quantidade de negros a serviço dos mais abastados em nossas cidades. Os nobres não faziam nenhum trabalho braçal ou mecânico. Nada era mais imponente para um rico cidadão do que sair às ruas, acompanhado de um cortejo de servos. Portanto, os senhores se preocupavam em mostrar que tinham muitos escravos e que podiam manter todos bem-vestidos. Assim, pajens e mucamas costumavam usar roupas à maneira europeia: vestidos, calções, casacas, librés, coletes, camisas e chapéus – de preferência feitos com tecidos finos. Poucos traziam sapatos ou chinelos. As mulheres mantinham o hábito dos turbantes e lenços na cabeça.
Uma cena comum era avistar um senhor ou senhora sendo carregado em liteiras fechadas (que também podiam ser cadeirinhas, palanquins ou redes para os mais pobres) por dois ou mais homens e um cortejo de escravos ou mucamas caminhando atrás, todos com roupas de luxo, provavelmente já usadas. As sinhazinhas andavam pela cidade (nas raras vezes em que lhes era permitido) com suas mucamas, que seguravam sombrinhas para evitar que o sol lhes escurecesse a delicada pele.
As joias também podiam fazer parte do visual dos cativos e eram uma forma de dar status aos proprietários. As negras e mulatas tinham especial apreço por figas, corais, pulseiras e argolas de ouro e prata. Quanto mais rico o senhor, mais cativos bem trajados podia exibir. Era a lógica da época. Quem não era tão abastado, ostentava como podia. Era costume fazer sacrifícios ou entrar em pesadas dívidas para adquirir pelo menos um escravo – muitos senhores e senhoras “respeitáveis” viviam à custa da exploração do aluguel de seus cativos.
Os escravos das cidades gozavam de relativa liberdade para os seus negócios. Havia muitos “de ganho” ou aluguel, que realizavam serviços em troca de pagamento. A maioria precisava entregar parte de seu lucro aos donos, mas mesmo assim era possível acumular certo capital para comprar a tão sonhada carta de alforria. As atividades desses cativos variavam muito: quituteiras que vendiam doces e outras iguarias, costureiras, bordadeiras, lavadeiras, ferreiros, pedreiros, vendedores, alfaiates (principalmente no século XIX) e outros que competiam com os brancos pobres nos ofícios mecânicos. Os negros e mulatos forros se incorporavam à massa de trabalhadores. A prostituição foi uma das alternativas de ganho para as mulheres cativas e libertas. Com isso, não é difícil deduzir que muitos escravos podiam adquirir mercadorias, como roupas e joias.
– Márcia Pinna Raspanti.
O hábito de ser carregado em cadeirinhas era símbolo de status.
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