Por Luiz Ernesto Wanke.
Tinha uns cinco ou seis anos quando, durante a Segunda Guerra Mundial, aconteceu na minha cidade – Ponta Grossa, Paraná – um treinamento para a população, que consistia de um apagão voluntário das luzes de casa para confundir os aviões alemães inimigos que supostamente voariam sobre nossas cabeças. Apesar de muito pequeno, guardei o inusitado na memória e, à medida que eu ia crescendo, cada vez mais me questionava se aquele exercício tinha acontecido mesmo, ou era fruto da minha imaginação. Porque sempre achei uma atitude absurda dada à distância da Europa até o sul do Brasil e ainda, com o Oceano Atlântico como principal obstáculo. Mas meu mano mais velho, Eno Teodoro – escritor e poeta – nas suas memórias, registrou este fato e através dele pude confirmar sua veracidade.
Quando tive que fazer pesquisas para meu livro sobre o nazismo, tive um susto ao saber que esses treinamentos de guerra não eram tão absurdos, porque Hitler pôs seu olho gordo em nosso país e tinha sérias intenções de anexar o sul do Brasil à Alemanha. Em 1933, quando já era chanceler, Hitler discursou:
“Nós edificaremos uma nova Alemanha no Brasil. Temos direitos adquiridos sobre esse Continente(a América) onde os pioneiros alemães possuem terras e exercem suas atividades.”
No mesmo discurso Hitler traçou a estratégia:
“Não faremos como Guilherme, o conquistador, isto é, desembarcar tropas e conquistar o Brasil com armas. As armas que temos não se veem...”
Esta tática de usar alemães instalados em outro território para realizar as aspirações de Hitler mostrou-se bem sucedida desde o começo da política expansionista, quando Seyss-Inquart, chanceler da Áustria, chamou “as tropas nazistas para manter a ordem”. A Áustria foi tomada ‘por telefone’ como relatou Goring em seu julgamento em Nuremberg. Em nossos tempos não lembra a recente anexação da Crimeia pelos russos?
Houve diversos fatores para que fracassasse a intenção de Hitler. Mas isto não quer dizer que o nazismo não se aproveitou da oportunidade de usar a seu favor sua grande colônia consolidada no Brasil. Principalmente com os ‘novos alemães’ (neuedeutche), um contingente de imigrantes que fugiram da recessão da República de Weimar, vindo se estabelecer no Brasil. Eram qualificados (mecânicos, soldadores, relojeiros, etc.) e, além disso, muito politizados e logo se agruparam e fundaram o Partido Nazista no Brasil, bem no momento que Hitler ascendia ao poder (1933).Todos os subordinados assumiam, como obrigação principal, contribuir financeiramente para os cofres da Alemanha. Afinal, eram alemães e o fato de residirem em outro território era irrelevante. E as empresas ligadas ao nazismo contribuíam com pelo menos 5% de seu lucro, além da obrigatoriedade da correspondente adesão para custear gastos com a publicidade do partido.
A Alemanha pós-Primeira Guerra amargou dívidas massacrantes, impostas pelo Tratado de Versalhes, dívidas que provocaram uma recessão violenta e uma inflação astronômica. Os ‘novos alemães’, atingidos por esta situação e obrigados a abandonar seu país,sentiam-se motivados a contribuir com a pátria de origem. Somem-se ao dinheiro proveniente de todos os cantos do planeta e aí se tem a explicação da maneira que o nazismo arrancou a Alemanha de um caos econômico para uma potência que no fim dos anos trinta era uma das primeiras economicamente e principalmente, militarmente.
A juventude, para Hitler, era o alvo principal da imposição da ideologia nazista. Os jovens eram estimulados a pertencer a Hitlerjungend, uma espécie de agremiação esportiva em que se reuniam em acampamentos do tipo escoteiros, mas no fundo, tinham como finalidade preparar futuros soldados alemães para uma eventual participação na guerra. Mas, ressalve-se, o nazismo não era para todo o mundo e se restringia aos alemães ‘puros’ e descendentes diretos (filhos de alemães).
Em Curitiba, se destacou o Club dos Planadores Ursinos, uma entidade de cunho legal, mas que escondia intenções espúrias por parte dos alemães. O objetivo principal era dar um treinamento para que os jovens pudessem fazer parte do Condor Sindicato, mas a intenção real era aproveitá-los nas fileiras da Luftwaffer, como depois aconteceu. No campo do Paraná, onde hoje se encontra o Centro Cívico de Curitiba, foi construído um barracão para abrigar planadores doados pelo governo alemão, com finalidades aparentemente esportivas.E para treiná-los com os planadores, os nazistas mandaramseu mais experiente piloto de testes, a aviadora Hanna Reitsch (ela testou para a Luftwaffer vários modelos,entre eles o Messerschimitt Me 163, o primeiro jato alemão que não teve tempo para participar da guerra). Por isso, era amiga de Von Braun.
Muitos aviadores brasileiros, saídos do Club dos Planadores, lutaram a favor da Alemanha. O principal foi o curitibano Egon Albrecht que como piloto de caça participou da Operação Barbarossa, na frente oriental, abatendo 15 aviões, e na frente ocidental derrubou outro 10, além de destruir outros 11 no solo. Tornou-se herói nazista recebendo a Cruz Germânica de ouro e foi o único brasileiro que recebeu a Cruz de Ferro na condição de cavaleiro. Foi morto na guerra, quando após um defeito mecânico no seu avião, o obrigou a afastar-se de sua formação e por isso foi abatido e depoismetralhado no ar pelo inimigo quando descia de paraquedas.
Tudo isto e com maiores detalhes, você pode ler em: “Piás de Hiltler”, de Luiz Ernesto Wanke.