Domitila fazia cenas de ciúmes com D. Pedro, que, diante dela, diziam, tornava-se submisso. Almoçavam juntos e ela o corrigia por palitar os dentes na mesa. O casal corria pelos corredores “como duas crianças a brincar” até ela ser alcançada e agarrada algumas salas depois. Para tornar a brincadeira mais excitante, ela fingia desmaiar. A intimidade entre o casal era tão notória que D.
Pedro falava da amante para Mareschal (ministro da legação austríaca na corte), sem constrangimentos.
A promessa de D. Pedro, de que a favorita não morreria de fome, cumpriu-se. Diz uma biógrafa que, durante os sete anos em que durou sua ligação com D. Pedro, ela enriqueceu. Morava em casa própria, cercada de belos móveis de jacarandá, tapeçarias, porcelanas e um exército de escravos e
mucamas. Seus jantares tinham cardápio sofisticado, fugindo do frango com arroz e ovos servido habitualmente no palácio. Além dos presentes e favores, Domitila correspondia ao temperamento
das empreendedoras paulistanas, acostumadas a tocar a própria vida: fazia excelentes negócios. Intermediava-os. Mareschal foi dos primeiros a anotar:
“Todas as graças, ofícios, empregos que vêm a tornarem-se vagos são dados ou a
amigos ou a parentes da favorita, ou por intermédio de sua recomendação.”
A casa da maîtresse, esclarecia, “transformou-se num verdadeiro escritório de negócios, onde tudo tem seu preço”.
Debret contou que havia uma engenhosa combinação entre Domitila e D. Pedro para garantir a propina de qualquer nova nomeação ocorrida no paço. O disfarce para vender esses favores era apostar com o candidato o cargo ou promoção que ele ia conseguir. Fingindo não acreditar, o interessado aguardava uma resposta nas imediações. Depois da sesta, D. Pedro vinha com a indicação certa, que passava à favorita, que, por sua vez, embolsava a aposta.
Carl Schlichthorst registrou a simplicidade do achaque: “Dona Domitila almoçava em trajes os mais caseiros, servida por seu mordomo e algumas camareiras. Expus-lhe minuciosamente o negócio do meu cliente e ela mandou que esperássemos na antessala a solução que seu mordomo nos comunicaria. A resposta não tardou.” Tudo se resolveria com a soma de um conto de réis… Sem
garantias de sucesso!
Corria que a própria Leopoldina sabia desses “negócios” e deles se teria queixado a José Bonifácio no exílio: o marquês de Nazaré teria pago 12 mil contos por “um trabalho” de Titília! Maldade ou verdade? E o pasquim que a acusou de aceitar dinheiro dos ministros ingleses Gordon e Smith para convencer D. Pedro a ratificar o tratado da independência, tão prejudicial ao Brasil – o Império obrigava-se a ressarcir dívidas do governo português e manter os privilégios da
velha Albion em terras brasileiras.
- Mary del Priore. “A Carne e o Sangue”, Editora Rocco, 2012.
Domitila: amor e ambição.