Modas Francesas

A França dominou a moda por séculos, desde que Versalhes era a corte mais chic e rica de toda Europa. O domínio francês – na verdade, em quase tudo ligado a produtos de luxo – atravessou o século XX e ainda hoje é parte do imaginário de todos nós. Atualmente, apesar de ainda associarmos luxo e moda à França (os italianos também ganharam muito terreno no século passado), as grandes grifes estão nas mãos de grandes corporações internacionais. Os estilistas também não são mais somente franceses, nem italianos. Temos pessoas das mais diversas nacionalidades à frente das marcas mais cobiçadas.

Vamos voltar um pouco no tempo para entender como as coisas mudaram. A rivalidade política e econômica entre Inglaterra e França se estendeu também para a moda. Hoje, esta disputa parece ter se dissipado no tempo, mesmo porque surgiram novos atores importantes no cenário internacional. Mas, entre os séculos XV e XIX, a situação era muito grave, e os dois países travaram diversas  guerras sangrentas.

 Na moda, que era ditada pelas cortes mais poderosas, a França reinou absoluta – com algumas épocas de glória dos reinos da Itália e até da corte espanhola – até o início do século XIX. Com a Revolução Industrial, a Inglaterra passou a fornecer tecidos para vários mercados e sua influência no mundo das roupas e acessórios aumentou muito. A França se protegeu com uma estratégia inteligente: intensificou sua imagem como produtora de produtos de luxo, enquanto os ingleses vendiam tecidos de preços mais baixos e qualidade razoável.

Para ilustrar a discórdia, vejamos como Balzac descreve as ricas senhoras inglesas, no conto do “Xale de Selim” (um texto delicioso, por sinal). É interessante notar como o escritor francês ridiculariza os britânicos, considerando-os sem o mínimo senso estético:  

“As inglesas têm uma falta de gosto particular (…), não sabem o que querem e se decidem a comprar uma coisa mais por uma circunstância fortuita que pelo seu valor. Reconheci uma dessas mulheres entediadas do marido, de seus moleques, virtuosas a contragosto, em busca de emoções, e sempre fantasiadas de carpideiras…” _ a fala é de um dos personagens, um astuto vendedor que acabara de empurrar para uma cliente um xale caríssimo e horroroso.

No Brasil, ou melhor no Rio de Janeiro, que era o maior centro de compras do país, em meados do século XIX, houve uma espécie de separação de territórios. A Rua do Ouvidor se tornou “território” dos franceses, abrigando maisons finíssimas. Era possível encontrar chapéus, luvas, roupas, acessórios, joias e artigos de toillete, nas lojas de madames genuinamente francesas – e de muitas mulatas chics, que logo dominavam as artes da costura e da ornamentação na indumentária.

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Os ingleses dominaram a venda de artigos masculinos, concentrando-se na Rua Direita e nas ruas da Alfândega, no Rio de Janeiro. Segundo Gilberto Freyre, em  “Ingleses no Brasil”, os negociantes provenientes da Inglaterra possuíam os melhores armazéns de fazendas e lojas para homens. Dificilmente, tornavam-se alfaiates como os franceses. Além de tecidos para “senhores finos” (casimira, seda, cetim, lãs, pelicas, veludos, rendas e algodões), comercializavam “fatos feitos”, meias de seda, luvas, lenços de seda, casacas, chapéus, coletes de sedas e tecidos mais ordinários, gravatas, jaquetas, espingardas e pistolas, artigos para montaria.



– Márcia Pinna Raspanti

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A Rua do Ouvidor em 1890 e a elegância das damas francesas no século XVIII.

 

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  1. Maraisa Gonçalves

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