Amores de freira: escândalos no convento

Quando imaginamos um convento, logo nos vem à mente um lugar severo, silencioso, habitado por religiosas reservadas e disciplinadas, sempre vestidas com seus pesados hábitos. Nem sempre esta imagem correspondeu à realidade, principalmente nos tempos do Brasil Colônia. Houve uma época em que as freiras eram alvos de sedutores, que ficaram conhecidos por suas diversas conquistas entre essas mulheres supostamente reclusas. Eram os chamados “freiráticos”.

É importante lembrar que naquela época a “vocação religiosa” era geralmente imposta. Famílias abastadas mandavam suas filhas para o convento, por causa da instituição do morgadio, em que o primogênito era o único herdeiro. Se este fosse mulher, ela era obrigada a seguir carreira religiosa, deixando a herança para o filho homem mais novo. Havia também um certo status em ter uma filha freira, que supostamente estaria com a castidade protegida.

Assim, as jovens sinhazinhas eram enclausuradas com todos os luxos, sempre contando com suas mucamas para servi-las. Longe da vigilância paterna, não era tão difícil namorar padres e leigos. Seduzir uma freira era trabalhoso, mas rendia uma certa reputação ao amante. A tradição dos freiráticos, por sinal, veio de Portugal – D. João V era um conhecido freirático. O contato com o mundo exterior estava garantido: escravos e mensageiros levavam recados, traziam presentes e marcavam encontros entre os amantes.

Emanuel Araújo, em “Teatro dos Vícios”, conta uma série de incidentes envolvendo amores “de freira”. Vejamos um exemplo. No convento de Santa Clara do Desterro, em Salvador (1737), um padre “moço” ficou provisoriamente como capelão, substituindo o antecessor que havia morrido. Logo, a convivência com as freirinhas causou confusão. A abadessa relatou que “é certo, público e notório os grandes divertimentos que (ele) tem com a madre Josefa Clara, religiosa moça”. Afoito, o pároco tentou subir pelo forro da capela para ter acesso ao dormitório de sua amante. A tentativa acabou em vexame, já que o rapaz foi pego em flagrante.

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O poeta baiano, Gregório de Matos, era um conhecido freirático, que tentou seduzir até a abadessa com seus versos. Ele dirigiu, muitas vezes, sua sátira impiedosa às salientes religiosas.

“Manas, depois que sou freira, apologuei mil caralhos, e acho ter os barbicalhos, qualquer de sua maneira: o do casado é lazeira, com  que me canso e me encalmo, o do frade é como um salmo, o maior do breviário, mas o c… ordinário, é do tamanho de um palmo”.

Gilberto Freyre, em “Casa Grande & Senzala” observa o caráter sensual dos nomes dos doces e bolos feitos nos conventos: barriga de freira, suspiros de freira, manjar do céu, toucinho do céu, etc. O fato é que as sinhazinhas eram mandadas para o claustro muito jovens, e continuavam a se comportar como meninas mimadas e petulantes para quem nada era negado. Não é de estranhar que aproveitassem as poucas oportunidades para usufruir de algum divertimento e liberdade.

O jesuíta português, Antônio Vieira, repreendeu as religiosas por causa da vaidade, exortando-as a jogar fora seus espelhos. Araújo destaca que os pais, talvez por sentimento de culpa, faziam questão de proporcionar às filhas reclusas todo o conforto material da vida secular. Os claustros estavam longe da simplicidade, cheios de roupas, joias, sapatos e outros artigos.

Luxo, ócio, vaidade, luxúria, romance, festas – parece que o cotidiano das freiras de antigamente era bem mais animado do que muita gente supõe…

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– Márcia Pinna Raspanti.

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“Freira”, de Jean-Jacques Lequeu.

9 Comentários

  1. maria
    • marcosjr
      • RIVALDO AZEVEDO
  2. MARIA ROSA MAZZUTTI
  3. Giovana Ramos
  4. Plínio
  5. juliani

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