Tropelias da polícia na refrigerante sombra da Rua Larga

Por Aloysio Clemente Breves Beiler.

A história de um povo está retratada nos jornais! Um primo de saudosa memória que gostava da leitura dos pasquins com validade vencida, acompanhava as notícias como se fossem capítulos de um livro. As guerras, as revoluções, o cotidiano popular e a política, para ele, tinham um sabor de romance.

Em 24 de maio de 1874, à noite, conversavam dois cidadãos “qualificados” na Rua Larga, quando foram intimados por um “urbano” que os mandou circular. A notícia saiu no jornal “O Brasil”. O editor relata que diante da negativa dos rapazes e de dois negociantes que chegaram para juntos protestarem contra a “tropelia do urbano”, foram encaminhados à polícia. O excesso policial foi resolvido pelo delegado Figueira de Mello, que se desculpou com os honrados negociantes. Pergunta então o editor: “Em que épocha estamos? Sob que regimen vivemos?”

O funcionalismo público, sempre muito criticado, servia de contraponto para uma notícia do Correio Mercantil. Existiam três lugares perigosos e propícios para emboscada no Rio de Janeiro: a praia de Santa Luzia, a rua Nova do Conde e a rua da Relação. Quanto à municipalidade… esta também tem seus esconderijos, e são muitos, escuros, ótimos para o descanso dos fiscais e guardas, enquanto as posturas e normas são muito claras.

No semanário “A vida fluminense” eram citados os “tempos difíceis”. Talvez parecidos com os que vivemos. Um anônimo solicitava ao comendador Dias da Cruz – nome de uma das ruas do Méier atual – , que o estado das ruas dos Andradas e São Pedro eram um escândalo, onde segundo ele haviam “caldeirões capazes de engolir uma machambomba inteira”.

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Não estavam em melhor sorte o calçamento da Rua Larga de São Joaquim próximo da igreja de mesmo nome. Deplorável! dizia o cidadão, e causador de solavancos monstruosos aos que ali transitam, quer em cômodas caleches, quer nas desconjuntadas diligências.

As árvores que foram plantadas ao longo da rua foram abandonadas, morrendo em pouco tempo. Reclama o cidadão: se houvessem cuidado, teríamos grandes copas e refrigerante sombra para o povo transeunte que vai diariamente à estação D. Pedro II, ou às diversas repartições da secretaria da Guerra. Salientava o missivista que: “Sombra, sombra e mais sombra, e água em profusão”, é o que precisa a cidade para ter boas condições sanitárias. E mais adiante solicitava que não se ouçam os médicos, pois a eles só interessam grande número de enfermos e pelo menos uma epidemia por ano.

A novidade fantástica do ano ficava por conta das “Pedras que Andam”, da Austrália, divulgadas pelo Jornal Naturaliste Canadien. Pequenos calhaus, seixos, encontrados em charcos, que se colocados em cima de uma superfície lisa, entram logo em movimento e juntam-se como ovos num ninho.

Enquanto isso, o Jornal da Tarde, de 18 de julho de 1870, noticiava que no palacete do Sr. Barão de Itamaraty, situado na rua Larga de São Joaquim, era oferecido um baile de gala a Sua Alteza o Sr. Conde d’Eu, pela oficialidade da Guarda Nacional da Corte. O povo comparecia ao Circo Olympico, companhia do Sr. Bartholomeu, acrobata calorosamente aplaudido por todos.

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O jornal “A Reforma”, de 5 de janeiro de 1871, publicava o apelo de alguns moradores para a algazarra insuportável num andar térreo de uma casa. O pagode começa às 10 e 11 horas da noite, a pretexto de ensaiar danças e cantigas, e vara a madrugada. “É tempo de fazer cessar certos hábitos e costumes que muito depõe contra a nossa civilização e que são péssimas consequências para a moralidade pública”, suplicavam os moradores.

Tropelias policiais, ruas mal cuidadas, sanitarismo deficiente, festas em palácios e circo para o povo. Coisas antigas? Talvez não.

 

Aloysio Clemente Breves Beiler

Baú da Rua Larga – Folha da Rua Larga

Instituto Cultural Cidade Viva

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