Por Luiz Ernesto Wanke.
Defendo no meu livro ‘Brasil Chinês’, de 2009, que nossos índios têm origem oriental, isto é, descendem dos chineses. Como a obra está praticamente esgotada, estou revendo e reformulando o conteúdo para, quem sabe, uma nova publicação, mas agora mudando o título. Quer dizer, as mesmas ideias com abordagem diferente.
Esses indígenas pré-colombianos têm ascendência chinesa, sim, seus olhos puxadinhos, seu biótipo oriental e sua genética, ‘não negam a raça’. Mas eles tinham também crença chinesa, pois, surpreendentemente eram taoistas! Como cheguei nesta conclusão? Só lendo meu livro, pois é uma longa história.
O taoísmo adota o Tao como um caminho, é mais uma filosofia de vida; respeitam deuses e deusas, têm amor à natureza e creem na transmigração das almas, entre outras coisas. Também e, principalmente, na dualidade Yin e Yang, os opostos que se completam em Tao. No caso, a pergunta é: se esses índios tinham este dualismo na sua crença ou se adoravam um deus único que chamavam de Tupã, como apreendemos na escola? Porque estou debruçado sobre este aspecto é que resolvi escrever este artigo. Penso que é uma novidade.
É verdade que antes do Cristianismo nossos índios não conheciam um deus único e onipotente como acreditamos. Logo após a chegada de Cabral, o escrivão Caminha comunicou a rei:
“Esses gentios não possuem crença nenhuma, situando-se na escala de seres abaixo dos cristãos.”
Fernão Cardim (um dos primeiros jesuítas que vieram depois do descobrimento), completa:
“Não tem conhecimento algum de seu Criador, nem das cousas do céu, nem se há pena ou gloria depois desta vida…”
Então como fica nossa história apreendida na escola que esses índios tinham um deus onipotente, associado ao trovão, que chamavam de Tupã?
Manoel da Nóbrega escreveu justamente sobre isto, para os índios de etnia Tupí:
“Os que se comunicam com nós, são duas castas, ‘Topinaquins’ e outra, ‘Topinambás’… Esta gentilidade nenhuma cousa adora, nem conhece Deus; somente os trovões chama de Tupane, que é como diz cousa divina. E assim não temos outro vocábulo mais conveniente para trazer ao conhecimento de Deus que chamar-lhe Pai Tupana.”
Portanto, o deus onipotente Tupã comparado com o dos cristãos, é uma interpretação dos jesuítas. Antes da chegada do cristianismo, esses índios de etnia tupi tinham dois deuses antagônicos, Monan, a divindade da criação e Tupã, a da destruição. Os Goitacazes – seus inimigos – também chamavam de Araia o deus do bem e Entozone, o do mal. Essas crenças duais, de nomes diferentes, mas de mesma intenção, se adaptam à religiosidade oriental do Yang e do Yin, mas nunca da ocidental.
Para os Maias, Man era o perverso deus do mal que habitava o centro da terra e era representado por um velho. Já o deus do bem era Tzultaca, jovem e formoso tal como um super-herói dos nossos tempos. Curioso é que, para os Maias, estes deuses antagônicos se submetiam a um deus superior chamado Itzama, num paralelo ao taoísmo onde o Yang e o Yin se completam formando o Tao, o caminho. Os Incas também reverenciavam este pensamento dualista porque tinham um deus bondoso em contraponto a um malvado, saído das trevas.
Qoa, do sul dos Andes, era um deus relacionado à chuva e, portanto, do bem. Era representado por um jaguar que voava nas nuvens e de cujo olhar saia os raios. Sua força dava origem aos trovões e ao arco-íris, sendo que sua urina se transformava em gotas. Era bom, se irrigava as plantações; mas se causava danos com granizo e tempestades, era mau. O espírito do mal Inca é Wana Kawri, respeitado e cultuado por este povo. Por isto os espanhóis se surpreenderam tanto que consideraram esses índios idólatras.
Voltando a Nóbrega, os colonizadores criaram para os índios um falso deus onipotente. O motivo é compreensível, isto porque observavam que os nativos só invocavam o deus mau – Tupã – já que o bom não lhes iria fazer mal. Portanto, não tinham como saber do outro deus antagônico. Essa regra se estendia para todos os povos pré-colombianos, tanto que o deus do mal sempre tinha mais ibope. Por exemplo, os Jívaros reverenciavam Yausa como deus do bem, que, como sempre, não era merecedor das atenções. Estas estavam todas dirigidas para o deus do mal, Iuanchi, para quem todos pediam.
Este maior destaque para o deus vilão, fez que o Jurapari fosse a personificação do anjo do mal e cada etnia tinha um cerimonial próprio para celebrá-lo. Já o deus do bem adquiria singularidade passiva, própria de cada clã.
Resumindo, Tupã era parte ruim do deus dual da etnia Tupi, mas não o deus onipotente que, nós, cara pálidas, acreditamos. Modestamente é minha contribuição para – quem sabe – um dia se corrigir as informações erradas de nossos livros escolares.
Gravura de Debret de uma índia Puri da Zona da Mata mineira. Não é um decalque de uma chinesa?
“Brasil Chinês”, de Luiz Ernesto Wanke, 331 páginas, 2009, Editora Lewi.
( Ainda disponível pela internet em algumas livrarias e nos sebos)
estou pesquisando as singularidades da cultura sumeria, especificamente a origem anunnak, com as religioes em outras partes do mundo…
me ajuda ai…
um abraço!