Você sabe o que significa fifós, cafunge, canada ou chaperon? E hetaira e gigolete? Essas palavras faziam parte do vocabulário de nossos antepassados, mas hoje são pouco usadas.
No terceiro volume da série “Histórias da Gente Brasileira” (Editora LeYa, 2017), Mary del Priore aborda o período de 1889 a 1950. A autora utiliza as memórias de pessoas que viveram o período e deixaram registradas suas impressões: jornalistas, escritores, historiadores ou simples observadores da realidade que os cercava.
“A verdade da memória é singular, não é? Contar o passado significa remontar longe nos anos, atravessar fronteiras, deixar-se guiar pelo fluxo das imagens, das associações livres, dos vazios e reentrâncias esculpidas pelo tempo. A memória seleciona, elimina, exagera, minimiza, glorifica, denigre. Ela modela sua própria versão dos fatos, libera sua própria realidade. Heterogênea, mas, coerente. Imperfeita, mas sincera.
Pode uma vida contar a História? Quem recorda suas pequenas histórias, conta também a grande História? E nas que são relembradas, encontramos as marcas do passado, os fenômenos que se repetem, a permanência dos hábitos ou as rupturas com a tradição, assunto desse livro? O poeta diria que a memória é como a corrente, forte e maciça, que puxa do fundo do poço, o balde cheio de lembranças”, diz Mary del Priore.
Além das histórias, contadas de forma pessoal por narradores como Zélia Gattai, Carolina Nabuco de Araújo, Nélson Rodrigues, Coelho Neto, Lima Barreto e tantos outros, figuras conhecidas ou pessoas comuns, entramos em contato com um vocabulário já esquecido, cujo significado se tornou distante. Palavras que caíram em desuso, muitas vezes porque definiam práticas e objetos hoje obsoletos. No final da obra, há um rico glossário que ajuda o leitor a se aproximar um pouco mais do passado.
Vejamos alguns exemplos:
Aluá: Bebida refrigerante, feita de cascas de abacaxi, milho, pão ou farinha de arroz, açúcar e sumo de limão, preparada às vezes com fubá.
Atrabiliário: Pessoa que se enfurece facilmente.
Avoengas: herança dos antepassados
Bernarda: Revolta popular, insurreição; alvoroço, desordem, motim.
Busilis: Parte mais importante, mais central ou mais difícil de algo.
Cafunje: Moleque arteiro e ladrão.
Canada: Antiga medida de capacidade equivalente a quatro quartilhos ou a um litro e quatro decilitros.
Chaperon: Senhora mais velha que acompanhava jovens a eventos sociais para lhe dar proteção ou proibir comportamento inadequado.
Deriçando: Praticando a derriça, operação que consiste em envolver o ramo do cafeeiro com a mão e deslizá-lo de dentro para fora, pela parte que contém frutos, a fim de derrubá-los.
Fifós: Pequeno lampião a querosene; bibiano, periquito.
Gaforinha: Gaforina, cabelo desgrenhado ou em desalinho; grenha.
Gigoletes: Prostitutas.
Hetaira: Prostituta de luxo.
Jacá: Tipo de cesto de taquara ou de cipó, usado para transporte de mercadorias em lombo de animais.
Manauê: Espécie de bolo feito de fubá de milho e mel.
Mocambo: Habitação rústica e pobre, geralmente no meio do mato.
Pacholas: Pessoa brincalhona, gozadora; farsola, gozador.
Picula: Brincadeira infantil em que uma criança deve correr atrás de outras para pegá-las, antes que cheguem a um ponto onde terão imunidade; angapanga, pegador, pega-pega, pique.
Porrões: Potes ou vasilhas de barro, geralmente bojudas e de boca e fundo estreitos.
Pussanga: Puçanga, Medicamento caseiro.
Sentina: Lugar onde se ajuntam as imundícies; latrina.
Silhão: Sela grande, com um só estribo, montada por mulheres vestidas de saia.
Sorna: Que ou quem se faz de preguiçoso por astúcia.
Tamina: Vasilha com que se media a ração diária para os escravos; a própria ração.
Zuarte: Tecido de algodão, azul ou preto.

Habitação de Negros, de Johann Moritz Rugendas. Exemplo de mocambo: Habitação rústica e pobre, geralmente no meio do mato.