As festas nos tempos coloniais mesclavam o sagrado e o profano; a religiosidade e a sensualidade. Nos séculos XVII e XVIII, havia um calendário oficial de datas festivas, que podiam ter caráter religioso ou político. No lado religioso, a Páscoa (na verdade toda a Semana Santa) era um dos principais eventos -, bem como o Natal e os dias dedicados aos santos.
As festas eram compostas por missas, novenas, procissões, fogos de artifício, bailes, além de comilança e bebedeiras. Em um ambiente extremamente pobre em atividades sociais e culturais, estas ocasiões tinham grande importância para a população em geral. As festanças eram ainda uma ótima oportunidade para que homens e mulheres desfilassem com suas roupas mais luxuosas. Nestas ocasiões, as pessoas podiam exibir os melhores tecidos, bordados, joias e todos os adereços possíveis. As irmandades se preparavam com antecedência para mostrar todos seus associados devidamente paramentados: havia competição entre os grupos para ver quem ostentava maior riqueza.
A Igreja tentava, geralmente em vão, normatizar esses eventos em que as pessoas costumavam cometer todos os tipos de excessos. Missas, procissões e novenas eram ótimas oportunidades para encontros amorosos, o que não agradava os religiosos. A comida, que tinha um aspecto cerimonial e sagrado nestas ocasiões, era ingerida em excesso, e o pecado da gula era frequente. Havia o costume de receber familiares, vizinhos e amigos em casa para almoços ou banquetes.
Era hábito, a exemplo do que ocorria em Portugal, a distribuição de comida pelas irmandades. As esmolas também eram importantes: mulheres da elite e membros das irmandades costumavam angariar fundos para a realização dos festejos. Outros esmolavam para pagar promessas. E o poder real aproveitava para demonstrar sua força. “O rei provedor e paternalista aparentava não descurar de seus filhos. Mas essa atenção apenas disfarçava o controle que sua autoridade deveria exercer no conjunto da sociedade”, conta Mary del Priore, em “Festas e Utopias no Brasil Colonial”.
Na Semana Santa, especialmente na Sexta-Feira da Paixão, era comum que os condenados pedissem perdão real pelos seus crimes. Os mais frequentemente atendidos eram os fornicários, aqueles que haviam praticado pequenos furtos e os que tinham cometido atos de violência contra escravos ou homens da mesma condição social. “O monarca ou a autoridade que o substituísse o concediam, na medida do possível, aproveitando a oportunidade para perdoar também os desertores das milícias”, diz a historiadora.
. – Márcia Pinna Raspanti
“Coleta de esmolas para as Irmandades (O ascendedor de lampião)”, de Debret.