Os banhos de mar, mesmo com muitas restrições, tiveram importante significado para as mulheres. Encarados inicialmente como remédio, acabaram por proporcionar uma nova oportunidade de convívio social.
A princípio, as “mulheres de respeito” tomavam banhos de madrugada, quando o dia ainda clareava, usando uma indumentária rigorosa feita de “calças muito largas de baeta, tão áspera que mesmo molhada não lhe pode cingir o corpo”. Do mesmo tecido, um blusão com gola larguíssima, à marinheira, abrigada a um laço amplo que servia de enfeite, mas também de tapume a uma possível manifestação de qualquer coisa que sugerisse um seio. Calças até os tornozelos caíam em babados, cobrindo os pés. Estes eram calçados com sapatos de lona e corda, amarradas, à romana, na perna. Na cabeça, uma touca de oleado ou chapelões de aba larga.
Mesmo com tantas precauções, a presença de mulheres na praia significava tal revolução, capaz até mesmo de mexer com a imaginação dos homens. Não eram, por consequência, poucas as admoestações que estes encontravam afixadas nas casas de banho, que se multiplicavam nas praias: “É expressamente proibido fazer furos nestas cabines; os encontrados nesta prática serão entregues à ação da polícia”. Apesar dos avanços, Hermínia Adelaide, conhecida artista, ainda escandalizava a população ao banhar-se na Praia do Flamengo com roupas que desenhavam-lhe a forma física. Todos paravam para olhar; as moças de família, encabuladas, viravam o rosto.
Em maio de 1923, a gaúcha Cecília de Assis Brasil, em férias na Avenida Atlântica, número 686, Rio de Janeiro, registrava no diário: “Às sete horas da manhã, toda a família está de roupa de banho, em volta da mesa, tomando café. Do outro lado da rua, está a praia. Agora que aprendemos a nos defender das grandes ondas, nadamos bastante todos os dias e até somos as moças mais ousadas deste bairro. Depois do banho, ficamos em casa até a hora do almoço, costurando, remendando, tricotando”.
Mas as mudanças caminhavam a passos largos. Para ficar num exemplo, no dia 8 de fevereiro de 1920, na piscina do Fluminense Futebol Club, ocorreu a primeira competição em piscina com três provas femininas. Nadaram: Edith Julien, Maria Augusta Lopes, Mirian Antunes e Adélia Caldas Brito. Tudo indica que, desde 1919, quando a piscina do Fluminense foi inaugurada (a primeira no Rio), mulheres, sócias do clube, já participavam de aulas de natação. Em 1949, a ligação pelo então túnel Carioca, hoje Túnel Novo, ganhou uma segunda galeria.
O fácil acesso às praias de Copacabana e Ipanema chegou com uma nova invenção: a do biquíni. Os cinejornais de César Nunes revelam as cariocas em pesados duas-peças, muitas delas esquivando-se das câmaras para não serem reconhecidas pelos familiares. A voz do locutor anunciava que a praia era patrulhada por uma “polícia marítima” encarregada de impedir “os malandros de tirar casquinhas no rebuliço das ondas da arrebentação”.
Esses foram os anos dourados da natação feminina. Na piscina do Flamengo, por exemplo, a arquibancada vinha abaixo com gritos de “Boa”, “Boa”, cada vez que a escultural Neusa Cordovil subia à raia para disputar uma prova. Em São Paulo, treinando no Tietê, destacou-se a grande nadadora Maria Lenk, autora de Natação, coroa dos exercícios físicos, livro no qual explicava que nadar “não prejudicava as virtudes femininas de graciosa fragilidade impostas pelo machismo dominador”. Revistas como a Tricolor, de 1929, louvavam a natação, esporte que transformava mulheres em sereias:
“Devemos destacar a prova em que Vera Oiticica, qual sereia encantadora, olhando o teto da piscina com o sorriso da vitória nos meigos lábios entreabertos, venceu a já famosa Veroneze. […] venceu admiravelmente bem. Como a nadadora excelente que é e empolgou ainda mais pela elegância do estilo que possui […]. O seu triunfo foi saudado por estrepitosa salva de palmas […] que sirvam de incentivo […] para que ela, jovem como é, chegue a ser mais tarde a embaixatriz brasileira em contendas mundiais […] Que Vera ofereça ao mundo um exemplo da pujança da nossa raça”.
Entre sereias e rainhas, Daisy Correa de Oliveira, nadadora do Fluminense, foi a rainha dos Jogos da Primavera de 1955.- Mary del Priore