Entre sedas e algodões: tesouros do passado

          No período colonial, os tecidos eram mercadorias de luxo. Importados via Portugal e comercializados a preços altíssimos pelos mercadores que os traziam de navio ao Brasil, os “panos finos” eram produtos muito cobiçados, que passavam de geração a geração, como qualquer outro bem de valor.

Nas primeiras décadas da colonização, a produção nacional se restringia aos algodões mais grosseiros para o uso da população em geral e dos escravos. Os índios já cultivavam e fiavam o algodão selvagem quando os portugueses chegaram por aqui. No século XVIII, essa cultura ganhou importância considerável, principalmente nos estados do Nordeste. A chita logo caiu no gosto popular e foi bastante usada até pelos mais abastados em cortinas, almofadas e na decoração.

Em 1785, quando a produção estava em franca expansão, o famoso decreto de D. Maria I proibiu a criação de manufaturas neste território para estimular a fabricação portuguesa e favorecer o comércio com a Inglaterra (que vendia para o Brasil por intermédio de Portugal). Enquanto isso, os algodões da Índia se tornavam cada vez mais cobiçados pelos fidalgos de toda a Europa e seus preços disparavam. No Brasil, o hábito de tecê-lo se manteve no âmbito doméstico, executado pelas escravas. Com a escassez de tecidos de boa qualidade e de outros produtos de luxo, os mercadores e os mascates, que percorriam as fazendas e povoados oferecendo seus artigos, lucravam muito com a vaidade brasileira.

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Os tecidos (em forma de retalhos, roupas, colchas, lençóis, toalhas de mesa, etc.) eram tão preciosos que constam nos inventários de bens confiscados pela Inquisição, ao lado de joias, objetos de ouro e prata (incluindo fivelas, botões e abotoaduras), armas (que eram acessórios importantes do traje masculino), mobiliário, animais, terras e escravos, entre outras mercadorias. Fato interessante ainda é que muitos inventariados ou réus nos processos inquisitoriais citavam dívidas com mercadores, alfaiates e sapateiros. (ver: “Inquisição: inventários e bens confiscados a cristãos novos”, de Anita Novinsky)

Um dos exemplos é o lavrador de cana Antônio da Fonseca Rego, de Olinda, preso em 22 de novembro de 1729, que declarou possuir “um vestido de lameite preto novo que constava de casaca, veste e calção forrado de baeta preta que tinha custado 40 mil réis, com meias brancas de seda e talabarde de marroquino […] quatro gravatas […] com uma rendinha muito pequena”. Os bordados e aplicações também eram valorizados. Antônio Rois de Andrade, do Rio de Janeiro, informou, em 1715, possuir “um capote de pano berri agaloado de ouro que lhe havia custado 50 mil réis”.

O mercador Belchior Mendes Correa, da Bahia, preso em 22 de novembro de 1726, declarou a posse de “um roupão de seda azul claro matizado com várias cores forrado de tafetá carmesim, novo, que valeria 20 mil réis”. Para se ter uma ideia do valor desses luxos em comparação a outros bens, observemos qual o custo dos animais de criação nos mesmos documentos. Diogo Nunes Thomas, lavrador de Pernambuco, preso em outubro de 1729, possuía “um cavalo e uma égua, que poderiam valer 13 ou 14 mil réis cada um” […] e ainda “três vacas paridas, cada uma com a cria valeria 4 mil réis“.

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– Márcia Pinna Raspanti

D.Maria Ia

 

D. Maria I: decreto que proibiu as manufaturas no Brasil.

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