Na trilha de Saint-Hilaire

Botânicos veem perda de biodiversidade, mas também lugares preservados, ao refazerem expedição de 1822

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Comerciante em Bananal, Vilmar da Silva estranhou ao passar com seu carro e ver um cinquentão grisalho com jeito de estrangeiro trepado em um barranco, segurando-se em um arbusto, na entrada de seu sítio, ao lado da rodovia dos tropeiros, antiga estrada Rio-São Paulo. Logo a tensão se desfez. O botânico francês Marc Pignal, do Museu Nacional de História Natural, de Paris, tinha subido no barranco apenas para coletar uma amostra de planta que havia lhe interessado. Eram 9 horas da manhã de 9 de junho de 2015, primeiro dia da expedição que refez o trecho paulista de uma viagem do naturalista francês Auguste de Saint-Hilaire à região em março e abril de 1822.

Em campo: Gaglioti coleta ramos de uma árvore...

Em campo: Gaglioti coleta ramos de uma árvore…

Durante cinco dias, quatro botânicos observaram lugares bastante modificados e outros preservados desde a região de Bananal, na divisa de São Paulo com o Rio de Janeiro, até Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo, quando comparados com os registros de Saint-Hilaire, publicados no livro Segunda viagem do Rio de Janeiro a Minas Gerais e a São Paulo. Em muitos casos as mudanças eram grandes, mas nem Saint-Hilaire nem os botânicos da expedição de junho cederam à nostalgia. Ainda que fascinado pela flora tropical, o naturalista francês previa que as florestas poderiam desaparecer para ceder lugar ao progresso e à civilização. “Ele pensava em alternativas de desenvolvimento para o Brasil, com base nos ideais da Revolução Francesa, e tinha uma visão utilitarista do espaço”, disse Sérgio Romaniuc Neto, pesquisador do Instituto de Botânica de São Paulo e coordenador da expedição.

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Financiada pelo instituto e pelo governo francês, a viagem integra um plano de resgate do trabalho de Saint-Hilaire no Brasil, coordenado por Romaniuc e Pignal. Romaniuc conheceu os cadernos de campo e a coleção de plantas brasileiras de Saint-Hilaire no Museu de História Natural de Paris, onde fez o doutorado, de 1996 a 1999. Para repatriar as imagens desse material, ele formalizou um acordo de cooperação entre o museu, o Instituto de Botânica e o Centro de Referência em Informação Ambiental (Cria), de Campinas, e foi um dos coordenadores da montagem de um herbário virtual, com os cadernos e cerca de 9 mil registros de plantas coletadas por Saint-Hilaire (ver Pesquisa FAPESP nº 229). Quando o herbário virtual entrou em operação, em 2009, Romaniuc e Pignal, coordenador dos acervos virtuais do museu, começaram a planejar as viagens para refazer os trajetos do naturalista francês. Esta foi a primeira. A próxima está prevista para outubro, partindo de Franca, norte paulista, até Itapeva, ao sul.

Pouco antes de chegar à entrada do sítio Joana D’Arc, no início do trabalho de campo, Romaniuc parou ao lado da rodovia para examinar a paisagem. “É uma mata bonita, mas não é mais primária”, explicou, apontando para um dos blocos de árvores em meio às pastagens e áreas de eucaliptos e bambus. “Não tem mais árvores de grande porte. Tem guapuruvu, uma árvore de porte, mas que também faz parte da vegetação secundária, porque cresce rápido e morre rápido.”

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“Parece que não existe mais nenhuma espécie nativa”, disse Pignal ao descer do barranco. “Talvez esta não seja introduzida”, comentou Marc Jeanson, coordenador do herbário nacional francês, mantido no museu de Paris, colhendo um ramo de um arbusto do gênero Mimosa. Espalhadas pelas margens da estrada e das matas havia muitas flores amarelas do melão-de-são-caetano (Momordica charantia), singelas, mas desimportantes para os botânicos, “um sinal da globalização das plantas”, definiu Jeanson. A mata que examinavam ocupou a área de um hoje extinto cafezal.

Veja a reportagem completa da Revista Pesquisa da FAPESP no link abaixo:

http://revistapesquisa.fapesp.br/2015/08/13/na-trilha-de-saint-hilaire/

 

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