Moda e elegância no Império

No século XIX, o país começava a sair de profunda sonolência. Sobretudo nas áreas urbanas. A vinda da família real, em 1808, introduzira hábitos sociais que foram se multiplicando nas várias camadas sociais. Recepções, casamentos, batizados, cortejos, jogos, óperas, enfim, o luzir de fidalgos dava modelos e incitava imitações. Construíam-se casas nobres, e palácios eram rapidamente recheados de “imensas cousas”. Móveis eram importados da Inglaterra, assim como o piano, para ser mansamente batucado pelas mãos das sinhazinhas. Importavam-se, também, professores de dança e canto, capazes de ensiná-las a animar bailes e saraus da cidade. Viajantes observavam o crescimento da influência francesa na importação de modas, artigos de fantasia e decoração. Em 1821, havia 54 modistas francesas instaladas no Rio de Janeiro. Não eram poucas as negras livres que, graças a “seu talento”, não apenas trabalhavam com tais profissionais, mas conseguiam “imitar muito bem as maneiras francesas, trajando-se com rebuscamento e decência”. Jornais dirigidos às mulheres exibiam figurinos, receitas culinárias, moldes de trabalhos manuais. Era o caso de o Correio das Modas, de 1839, o Espelho Fluminense, de 1843, o Recreio do Bello Sexo, de 1856, ou o Jornal das Famílias, de 1863.

Ouçamos a descrição que Álvares de Azevedo fez, em 1849, dessas belezas que enfeitavam um baile acadêmico:

A Condessa de Iguaçu e a Belisária eram as rainhas do baile, com a diferença que a Belisária com a simplicidade de seu traje estava mais bonita do que a Bela com a sua riqueza de joias e sedas. A Bela tinha um vestido cinzento que lhe fazia uma cinturinha de sílfide – No colo numa volta só lhe corria o colar de finíssimas, digo grossíssimas pérolas. Na cabeça prendendo as tranças tinha um pequenino boné à grega, cujo fundo era de rede de prata e em franja também de prata. No colo, na cintura, no bouquet exalavam-lhe perfumosos ramos de violetas.

A Bela era ninguém menos do que a filha da Marquesa de Santos com o imperador dom Pedro I. Na época em que a jovem condessa de Iguaçu rodopiava pelos salões, os vestidos, armados e em forma de sino, inflados pelo uso da crinolina, estavam na moda. As flores – outra moda – acentuavam o erotismo dos contornos, a cintura fina, um decote ligeiramente mais ousado. Flores deveriam coroar a beleza da mulher-flor.

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Importada da França, que sempre ditara a última tendência, ao final do século XVIII, a moda eram as saias corola, usadas por Maria Antonieta. Desfolhada durante a Revolução Francesa, essa encolheu a ponto de se assemelhar à espiral de uma íris; dessa mesma maneira, foi largamente utilizada durante o Diretório e o Império. As mangas haviam se enchido, tal cálice de imensa papoula. A Restauração voltara a encher as corolas das saias.

Tanta inflorescência alimentou a fabricação de flores de penas, escamas e asas entre nós. Entremos em uma dessas lojas para conhecer, de perto, o acessório mais importante da moda oitocentista no Brasil:

“[…] seguindo pela Rua do Ouvidor, chega-se ao estabelecimento de Madame Dubois, a principal fabricante de flores de pena no Rio. Ela sucedeu Madame Finot […] Ao entrar em sua loja, encontra-se a parte da frente destinada à venda de flores, e a de trás à sua fabricação. As caixas nas paredes e nas janelas estavam cheias de flores das mais belas, grinaldas de flor de laranjeira, festões de cravos brancos pintados de azul e rosa, e camélias alvas […] Na parte de trás da loja havia uma longa separação, atrás da qual muitas moças trabalhavam, armando as flores, torcendo, cortando e colando com afinco. Diante delas havia montes de penas, um monte de cada cor. De fato, é surpreendente como um material tão delicado pode ser manejado com tanta perícia, principalmente porque as flores não são tingidas, como as da Madeira, mas formadas por penas isoladas, coladas para produzir todos os efeitos. Ao manter em público o processo de fabricação, Madame Dubois oferece uma garantia material da ausência de tinturas, demonstrando que as flores são feitas, honestamente, de penas de muitas cores. As dames de comptoir são geralmente mulatas e, embora mais escuras até que as moças espanholas, são geralmente mais belas. Uma demoiselle inglesa é mantida para atender visitantes ingleses e seu emprego não parece uma sinecura.

 

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Os preços das flores variam. Como são mais comuns, os cravos são vendidos por um mil-réis cada; dos outros tipos de flor, Madame Dubois em geral cobra demais para o bolso do pessoal da Marinha. Os pássaros custam comumente dez xelins a dúzia; existem alguns “extrassuper” beija-flores, vendidos a três mil-réis cada, e as aves-do-paraíso custam vinte mil-réis”.

Além das flores e dos chapéus, luvas e sapatos eram assessórios que chamavam a atenção dos homens da época. – Mary del Priore.

Crinolina

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