Luxo, moda e Inquisição

No Brasil Colônia, os moradores mais abastados queriam, de todas as formas, se destacar das camadas mais pobres da população. Para isso, faziam questão de exibir os sinais externos de riqueza, vestindo-se com roupas luxuosas, muitas joias, e ostentando um grande número de escravos. Com a escassez de tecidos de boa qualidade e de outros produtos de luxo, os mercadores e os mascates, que percorriam as fazendas e povoados oferecendo seus artigos, lucravam muito com a vaidade brasileira.

            Os tecidos (em forma de retalhos, roupas, colchas, lençóis, toalhas de mesa, etc.) eram tão preciosos que constam nos inventários de bens confiscados pela Inquisição, ao lado de joias, objetos de ouro e prata (incluindo fivelas, botões e abotoaduras), armas (que eram acessórios importantes do traje masculino), mobiliário, animais, terras e escravos, entre outras mercadorias. Fato interessante ainda é que muitos inventariados ou réus nos processos inquisitoriais citavam dívidas com mercadores, alfaiates e sapateiros.

            Um dos exemplos é o lavrador de cana Antônio da Fonseca Rego, de Olinda, preso em 22 de novembro de 1729, que declarou possuir:

“Um vestido de lameite preto novo que constava de casaca, veste e calção forrado de baeta preta que tinha custado 40 mil réis, com meias brancas de seda e talabarte de marroquino (…) quatro gravatas (…) com uma rendinha muito pequena”

O mercador Belchior Mendes Correa, da Bahia, preso em 22 de novembro de 1726, declarou a posse de “um roupão de seda azul claro matizado com várias cores forrado de tafetá carmesim, novo, que valeria 20 mil réis”. Para se ter uma ideia do valor desses luxos em comparação a outros bens, observemos qual o custo dos animais de criação nos mesmos documentos. Diogo Nunes Thomas, lavrador de Pernambuco, preso em outubro de 1729, possuía “um cavalo e uma égua, que poderiam valer 13 ou 14 mil réis cada um” […] e ainda “três vacas paridas, cada uma com a cria valeria 4 mil réis”.

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            A Inquisição também usava o vestuário como ferramenta de punição, tornando público o fato de que a pessoa em questão havia pecado contra a fé. Entre as penalidades aos condenados pela Inquisição, estava a imposição do uso de um hábito com a cruz vermelha e amarela no peito e nas costas, o “sambenito”. Era um castigo terrível infligido aos “penitentes reconciliados”, pois o traje trazia a vergonha da heresia, e todos que o vissem sabiam que o portador estava marcado para sempre. Esses pobres coitados também eram proibidos de usar seda, ouro, prata e espadas; enfim, lhes era negado qualquer símbolo de distinção ou fidalguia. Era uma situação de extrema humilhação para quem vivia em uma sociedade que valorizava tanto o “parecer”.

Texto de Márcia Pinna Raspanti.

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Os fidalgos da colônia: gosto pelo luxo.

– Referências Bibliográficas:

Anita Novinsk, “Inquisição: inventários de bens confiscados a cristãos novos no Brasil”.

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