Gravuras eróticas: a arte lasciva

           Os séculos XVIII e XIX nos remetem à ideia de puritanismo, moralismo, regras sociais rígidas. Quando estudamos mais detalhadamente o período, percebemos que a sociedade não era tão casta assim. “O laço entre a hipocrisia das convenções, próprias às camadas ricas e a tensão erótica que elas contribuem a reforçar, fornecerá o tema essencial para a libertinagem. Inspirada pela máscara da boa educação, esta retórica exprimia os constrangimentos de uma sociedade galante que matava o amor, ao transformá-lo em vício. Falar de sexo tornou-se uma compensação agradável para o vazio espiritual de uma elite”, conta Mary del Priore, em História do Amor no Brasil.

         Na segunda metade do século XIX, não faltaram os chamados “romances para homens”. Na forma de brochuras com inúmeras gravuras e estampas, os textos eram muito apreciados. “Escritos escandalosos marcavam a maneira das elites protestarem contra o puritanismo oficial. Afinal, em numerosas regiões do Ocidente moderno, as autoridades religiosas já tinham tido sucesso em transformar o sexo em ato abjeto e qualquer distração sensual, em tentação diabólica. É preciso, contudo, desconfiar da liberação idealizada cantada nos textos eróticos ou pornográficos. Expressão de necessidades não satisfeitas, esta literatura mais representa um contraponto à progressiva imposição da repressão sexual. Repressão que atingiu”, destaca Mary.

        E não se falava apenas de sexo. As pinturas e gravuras eróticas, e mais tarde as fotografias, inspiravam nossos antepassados. Com os avanços ocorridos no início do século XX, as imagens de nudez e cenas pornográficas se tornavam cada vez mais comuns. “Na época, o que mais preocupava era a difusão do nu. Fotografia, cinema e imprensa encontraram um nicho de mercado na venda de material pornográfico. As imagens, sobretudo, enchiam olhos e cabeças da rapaziada”, diz a historiadora.

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      Como sabemos, representações eróticas não são nenhuma novidade. Os povos antigos (gregos, mesopotâmios, romanos, entre outros) deixaram uma série de pinturas, esculturas e imagens relativas à prática sexual. O Kama Sutra e as gravuras japonesas (Shunga) ainda são muito apreciados. Mas ainda hoje, curiosamente, provocam escândalo. Outro dia ao publicar uma gravura do francês Jean-Jacques Lequeu (1757-1826), um arquiteto não muito bem sucedido que publicou uma série de “figuras lascivas”, o blog foi censurado pelo Facebook. A imagem mostrava uma sensual freira com os seios parcialmente nus. Isso me levou a pesquisar um pouco mais sobre o autor da “indecente”obra que consegue chocar ainda no século XXI.

      Entre as gravuras de Lequeur, a da maliciosa freirinha (abaixo) é uma das mais pudicas. O francês produziu diversas representações da genitália feminina, com uma riqueza de detalhes desconcertante, quase científica. Uma de suas obras mais conhecidas é “O deus Príapo”, que retrata o órgão sexual masculino.  Enfim, o arquiteto e desenhista é um personagem histórico fascinante, controverso, em especial por suas ideias arquitetônicas e seu fascínio pelo corpo humano.

frère_jean jaques lequeu

      Outro artista bastante ousado foi o húngaro Mihály Zichy, nascido em 1827, conhecido pela sua obra romântica. Além de suas grandes pinturas para a alta sociedade da Hungria, Mihály produzia gravuras eróticas, que abordavam temas como relações homossexuais entre mulheres e outras variadas práticas sexuais. A série mais conhecida do pintor nessa linha tem o nome de “Two Lovers”.

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       Enfim, não é fácil conhecer a vida sexual de nossos antepassados, mas a arte erótica nos ajuda a entender um pouco mais sobre essa dualidade entre pudor e sexualidade.  O assunto tem atraído a atenção de diversos estudiosos, proporcionando uma variedade de obras importantes sobre o tema. Esse texto despretensioso teve como objetivo apenas apresentar algumas curiosidades e estimular o debate. – Márcia Pinna Raspanti.

lequeur

Jean-Jacques Lequeu  Dessin d’un boudoir, (côté canapé, entre 1779 et 1795).

Mihály Zichy - Liebe 12

“Amor no Bosque”, Mihály Zichy. 

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