Aonde nos levará a superexposição da intimidade?

Maior tolerância e quebra de tabus em relação à sexualidade são a marca do século XXI. Bancas de jornais exibem “mulheres fruta” de todos os tamanhos. Nos outdoors de propaganda, casais seminus lambem os beiços e trocam olhares açucarados. Nas novelas de televisão, em horário nobre, nenhum personagem hesita em ratificar suas preferências sexuais, em expô-las e em expor-se. Na frente das câmaras, segredos pessoais são revelados sem constrangimentos. Práticas, antes marginalizadas, estão nas telas. Programas como o Big Brother estimulam o voyeurismo do espectador. A Internet abriu um universo de possibilidades para o sexo. Da pedofilia à prostituição, tudo se encontra no mercado virtual.

Nos sites, “ricos e famosos” falam abertamente de sua vida particular. A privacidade entrou na rede social. Todo mundo sabe onde está todo mundo, o que faz, com quem “ficou” ou dormiu. O paradeiro de cada indivíduo é mostrado no twitter, onde também aparecem as primeiras referências ao sexting (contração de sex e testing,): prática de divulgação de conteúdos eróticos através de celulares. Muitos iniciam relacionamentos através das redes sociais como Facebook ou Orkut.   Nelas começam o “flert”, namoram “virtualmente” e cada vez mais um número crescente destes relacionamentos virtuais, acaba com o encontro físico das partes, na igreja. O costume iniciou-se através das mensagens de texto SMS, mas com o avanço tecnológico, incluíram-se o envio de fotografias e vídeos, inclusive pornôs. Ao mesmo tempo, a gravidez na adolescência aumentou. Segundo pesquisas do IBGE, o número de casamentos caiu. Mais mulheres, mais velhas, unem-se a homens mais jovens. Elas procriam mais tarde, também.

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Se a ideia de interioridade dava consistência à vida dos indivíduos no passado, hoje, vivemos, apenas, o instantâneo. Em toda a parte, maior dose de superexposição é possível por meio de redes e da mídia, e o exibicionismo é uma das motivações para seu uso. Expõe-se o ego, sem meios-termos. Habitamos uma sociedade narcisista e confessional. Mas como mudamos através dos tempos! A atenção que damos ao corpo, à nudez e ao sexo é cada vez maior. Outrora era diferente. Homens e mulheres tiveram que se dobrar, às chamadas “boas maneiras”. Andar nu, fazer sexo, defecar ou urinar publicamente eram hábitos – ainda presentes em várias culturas ou grupos – que foram lentamente banidos de nosso convívio. A educação do corpo trilhou sendas variadas e obrigou a fórmulas de contenção, contrariando o desejo e os apelos da “natureza”. Antes, malcheirosos e sujos; hoje, perfumados. Ontem, marcados por cicatrizes. Atualmente, cauterizados. No passado, castos e cobertos. Agora, desnudos e exibidos. Evolução? Não… Um longo processo de transformações ao sabor de vários dados: técnicos, econômicos e de educação.

As relações com a intimidade refletem como os processos civilizatórios modelaram gradualmente as sensações corporais, acentuando seu refinamento, desenrolando suas sutilezas e proibindo o que não parecia decente. O quadro que se apresenta mostra o polimento das condutas e o crescimento do espaço privado e da auto-repressão; o peso progressivo da cultura no mundo das sensações imediatas, do prazer e do sexo; o cuidado de si e o trabalho permanente para definir as fronteiras entre o íntimo e o social. Pensamos como este complexo mecanismo migrou do Velho para o Novo Mundo, atravessando séculos. E de como hoje, as relações entre os sexos, na intimidade ou fora dela, está em plena transformação. Resta saber onde ela nos levará…

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 – Mary del Priore (baseado em “Histórias Íntimas”). nu perante a câmera Julien Vallou de Villeneuve (French, 1795–1866)

Nu perante a câmera Julien Vallou de Villeneuve (French, 1795–1866).

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  1. Dé Cerqueira

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