A sexualidade dos idosos nos choca?

Nos últimos dias, fotos íntimas do ator Stênio Garcia, 83 anos, e a mulher, Marilene, 36 anos mais jovem, têm causado um grande alvoroço na mídia e nas redes sociais. O casal aparece nu, em imagens divulgadas sem autorização. É interessante notar que, pela perplexidade das pessoas, muita gente esquece ou prefere ignorar que os idosos também fazem sexo. A reação das pessoas, entretanto, foi imediata: piadas sobre a situação e sobre a figura do ator, acompanhadas de certa admiração pelo seu vigor sexual. Apesar de velho, ele estaria em boa forma e sexualmente ativo, na companhia de alguém bem mais jovem e atraente.

Em meados do século passado, o envelhecimento começou a ser sinônimo de perda de prestígio e afastamento do convívio social. A gordura começava a ser associada à velhice e a lipofobia ganhava força (daí a ênfase dada ao fato de Stênio estar em boa forma). ”Velhice é um tema que provoca arrepios. Palavra carregada de inquietação e angústia, também representa uma realidade difícil de capturar. Quando é que se fica velha? Aos 60, 65 ou 70 anos? Nada mais flutuante do que os contornos da velhice, vista como um conjunto complexo fisiológico-psicológico e social. Temos a idade das artérias, do coração, do comportamento?”, pergunta Mary del Priore.

Recentemente, envelhecer passou a ser vergonhoso. Beleza, saúde, sensualidade, vigor – tudo isso está tão ligado à juventude, que passamos a considerar os mais velhos seres assexuados e, em certa medida, até inúteis. Não se valoriza mais a experiência e a sabedoria das pessoas. Mas, o episódio das imagens íntimas do ator levanta ainda outra questão: homens e mulheres envelhecem do mesmo jeito?  Ou melhor: como a sociedade enxerga o envelhecimento feminino e o masculino?  A idade afeta ambos da mesma forma?

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Com certeza, as diferenças são muitas. Apesar de os casamentos entre homens mais velhos e meninas mal saídas da infância ter sido prática comum no Brasil desde os tempos da Colônia, as uniões entre mulheres maduras e homens mais jovens eram vistas como indecentes. A mulher com mais de trinta estava “passada”.  As mulheres que se aventuravam nesse tipo de relacionamento eram severamente julgadas pela sociedade. Hoje, apesar de muitas celebridades desfilarem ao lado de jovens rapazes, ainda existe mais preconceito quando a mulher é mais velha. Fico imaginando qual seria a repercussão das fotos da nudez de uma mulher de 83 anos ao lado de um companheiro quase 40 anos mais novo…

Assistimos atualmente a uma busca pela juventude eterna. Homens e mulheres maduros não medem esforços para se manter jovens. Para isso, existe um mercado que fatura bilhões com cremes, vitaminas, suplementos, exercícios, cirurgias, tratamentos, dietas, tinturas para cabelos, etc. Qual o limite entre a busca por uma melhor qualidade de vida e a obsessão pela juventude inatingível? Cabe a cada um decidir. Nesse sentido, o surgimento do viagra trouxe aos homens a possibilidade de exercer a sexualidade perdida. Se antes, apesar de todas as intervenções estéticas, os idosos ainda ficavam para trás dos mais jovens nesse campo, com a pílula azul veio a esperança de vencer mais essa batalha contra a idade.

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Entretanto, voltemos ao veterano ator. Devido às insinuações de que ele teria o hábito de recorrer à pílula azul, a esposa veio em sua defesa para dizer que “o viagra dele sou eu”. De vítima da invasão da privacidade a herói dos machões, Stênio Garcia acabou sendo exaltado pela sua “surpreendente” virilidade. O episódio mostrou que a sexualidade dos idosos do gênero masculino ainda pode ser vista com certa naturalidade, principalmente com parceiras mais jovens. Em relação às mulheres, nem sempre é assim…Lembro-me de uma cena de novela (não sei o nome) que mostrava um beijo discreto entre duas atrizes, já idosas, Fernanda Montenegro e Nathália Timberg, que causou uma verdadeira comoção. Uma cena igual com duas jovens e atraentes atrizes teria causado tanto horror? Acredito que não. Se a sexualidade feminina ainda é tabu, a sexualidade das mulheres mais velhas é bem mais problemática.

Para muita gente, a mulher que assume o papel de mãe e esposa deve deixar a sua sexualidade em segundo plano. “Mães precisam se comportar como mães” – quem nunca ouviu isso? E as avós? São seres doces e calmos que vivem a tricotar e a fazer comidinhas gostosas? Ou são mulheres como todas outras? Até quando lhes negaremos o direito de exercer sua sexualidade? Somente os jovens e belos têm direito ao sexo? – Texto de Márcia Pinna Raspanti.

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