Sociedades Secretas no Brasil

Por Paulo Rezzutti.

Às vésperas da Independência do Brasil, em 1º de janeiro de 1822, D. Pedro I enviou de São Paulo uma carta ao seu amigo e ministro José Bonifácio. No final, encontramos um misterioso pedido: “Recomende-me aos senhores nossos II  e CC  (…)”.

Essa simples frase, cheia de pontos em formatos estranhos, revela o contato estreito do então príncipe regente, a poucos dias de virar o primeiro governante do Brasil independente, com duas sociedades secretas operantes durante o processo histórico que culminou no 7 de setembro. Os três pontos, cada um no que seria um vértice de uma pirâmide, antecedidos por duas letras “i”, são até os dias de hoje utilizados por membros da Maçonaria e significam “irmãos”. Se essa primeira sociedade é ainda hoje conhecida no mundo inteiro, a outra, que se revela nas duas letras “c” seguidas por quatro pontos em forma de cruz, que significavam “camaradas”, foi uma ordem secreta 100% brasileira que teve uma vida efêmera. Tratava-se do “Apostolado da Nobre Ordem dos Cavaleiros da Santa Cruz, ou, simplesmente, Apostolado.

D. Pedro foi iniciado na Maçonaria em 2 de agosto de 1822, adotando o nome de Guatimozín, o último imperador asteca, que tentou resistir aos invasores espanhóis. Nesse período, a partir de 1821, com a campanha de emancipação política do Brasil, as lojas existentes começaram a ter um papel político mais vigoroso, embora já existissem registros de atividades maçônicas no Brasil desde o século XVIII. Em 1822, durante o processo da Independência, foi criado o Grande Oriente do Brasil, ou brasiliano, conforme ata de 17 de junho, com o qual a Maçonaria brasileira libertou-se e tornou-se independente do Grande Oriente Lusitano, que o reconheceu.

Ver mais  7 de setembro: o "Grito do Ipiranga"

Inspirado pelos ventos da Revolução Francesa, da Independência da América do Norte e das Guerras Napoleônicas, que varreram por algum tempo da Europa o absolutismo, a Maçonaria brasileira tentava atrair o então príncipe regente D. Pedro para si. Se alguns elementos maçônicos sonhavam com a implantação da República no Brasil, a grande maioria achava que a independência definitiva de Portugal se daria de maneira menos traumática se contasse com a simpatia de D. Pedro, por isso buscou atraí-lo para a causa brasileira.

Foram os maçons, capitaneados por Joaquim Gonçalves Ledo e José Clemente Pereira, presidente do Senado da Câmara do Rio de Janeiro, que se movimentaram para dissuadir D. Pedro de cumprir as ordens das Cortes Portuguesas, que solicitaram o retorno dele à Europa em fins de 1821. Inclinado a respeitar as diretrizes das Cortes, o príncipe regente foi dissuadido pelo movimento de Ledo e Pereira, que conseguiram a adesão de representantes de Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo e Bahia ao pedido para que não deixasse o Brasil, levando ao Dia do Fico, em 9 de janeiro de 1822. Em 13 de maio do mesmo ano, a Maçonaria concedeu a D. Pedro o título de “Protetor e Defensor Perpétuo do Reino Unido do Brasil”, o qual o príncipe declinou parcialmente, aceitando apenas o de “Defensor Perpétuo”.

O Apostolado da Ordem dos Cavaleiros de Santa Cruz foi fundado por José Bonifácio também em 1822, com o objetivo de defender a integridade do Brasil e lutar por sua independência. Porém o propósito primordial era combater o grupo de Gonçalves Ledo, que, se a princípio havia aceitado a monarquia constitucional como caminho rápido para a separação, acalentava o sonho republicano.

Ver mais  D. Leopoldina, uma nova biografia

Tanto a Maçonaria como o Apostolado acabaram sendo, cada um a seu tempo, fechados por ordem de D. Pedro. Porém a influência das duas sociedades secretas no processo político da Independência é inegável. Das reuniões do Apostolado entre janeiro e março de 1823, por exemplo, como mostram as atas reunidas no Acervo Histórico do Museu Imperial, em Petrópolis, encontramos debates de artigos que serão apresentados ao projeto da Constituição do Império em setembro desse ano pelo deputado Antônio Carlos, irmão de José Bonifácio, membro dessa sociedade.

O escritor e maçom Luiz Gonzaga da Rocha, presidente do Tribunal Distrital de Justiça do Grande Oriente do Distrito Federal e autor do livro A Bucha e outras reminiscências maçônicas, afirma que atualmente “a Maçonaria exerce pouca ou quase nenhuma influência na sociedade brasileira”. Segundo Rocha, isso ocorre devido ao baixo índice de inserção social e ao fato de a sociedade estar afastada do cenário político-econômico-social e ausente das discursões e agendas das questões de interesse nacional. “Sem poder contar com uma elite estratégica e planejamento operacional de envergadura, encontram-se os maçons reduzidos aos espaços internos dos templos e à esporádica, tênue e envergonhada filantropia comunitária.”

Quadro 1 – Influência da Maçonaria em Movimentos Revolucionários e Sociais Brasileiros:

Ano

Movimento Líderes dos movimentos que eram maçons

1789

Inconfidência Mineira José Alves Maciel, José Joaquim da Maia, Domingos Vidal Barbosa, Padre Rolim

1817

Revolução Pernambucana Domingos José Martins

1822

Independência do Brasil Gonçalves Ledo, D. Pedro I, José Bonifácio, Cipriano Barata

1824

Confederação do Equador Frei Caneca

1835

Revolução Farroupilha Bento Gonçalves, Davi Canabarro, Garibaldi

1873

Convenção Republicana de Itu Américo Brasiliense, Rangel Pestana, Campos Sales, Bernardino de Campos, Prudente de Morais

1888

Abolição da escravidão Visconde do Rio Brando, João Alfredo, Rodrigo Silva, Joaquim Nabuco

1889

Proclamação da República Deodoro da Fonseca, Benjamin Constant, Floriano Peixoto
Ver mais  A Comissão da Verdade e a "caixa preta" do regime militar

 

 frank_1maçonariaskullsandbones

Túmulo do Júlio Frank, fundador da Bucha e que está enterrado na Faculdade de Direito da USP, no Largo de São Francisco; símbolo da Maçonaria; Sociedade Skill and Bones dos EUA.

 

6 Comentários

  1. Alex
  2. Jailton Martins de Sousa
  3. Clores morai
  4. José Ventura
  5. Edi

Deixe uma resposta