Filhos: ter ou não ter?

Se filhos suscitam questionamentos, polêmicas e atitudes, o fato de querer ou não tê-los nunca foi percebido da mesma maneira. Na Antiguidade, a posição era natalista. Por exemplo, Aristóteles, no seu Política, registrou que a família foi a primeira comunidade humana, mas que o homem, além do fato biológico e do instinto, tinha necessidade de motivos para procriar. O “seguro velhice” seria um deles. Pais poderiam esperar que o tratamento dado à progenitura lhes fosse retribuído quando necessário. Desde a Antiguidade, a continuidade do nome, a semelhança física e a herança são elementos que permitem ao efêmero indivíduo aproximar-se do ciclo eterno e imaginar que uma parte dele há de lhe sobreviver.

Durante a Idade Média, a ideia era procriar para Deus. Duas vias de realização se apresentavam para os cristãos: fundar uma família sob as bênçãos do sacramento do matrimônio e, nela, ser férteis, multiplicando-se. A devoção ao Menino Jesus, em expansão nesse período graças a são Francisco de Assis, contribuiu para sacralizar a família. Ou para renunciar à vida familiar. Os que se colocavam a serviço de Deus adoravam o Menino, na mais absoluta abstinência sexual.

Na Idade Moderna, a laicização mudou o debate. A questão não era mais o Menino Jesus salvar os pecadores, mas a criança salvar a humanidade. Por sua fragilidade, ela suscitaria compaixão, primeiro sinal de moral e signo distintivo da humanidade, explicava o filósofo Jean-Jacques Rousseau. Graças à educação, devia-se reformar não o presente, mas o futuro, representado na infância. Os filhos poderiam regenerar o mundo. A reboque desse argumento, várias políticas natalistas foram implantadas na Europa. Acreditava-se que da juventude de uma população dependia o poder da nação.

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Hoje, o sentido da maternidade assumiu outras formas. Para muitas mulheres, ela é uma maneira de realização pessoal. A fecundação in vitro é prova disso, refletindo o “direito de ser mãe”. Porém, alertam especialistas, o filho desejado a qualquer preço pode se tornar uma muleta narcísica, uma espécie de cosmético existencial, se a visão egoísta da descendência consistir em fechá-lo no exclusivo desejo de realização da mãe.

Uma outra forma é considerar a maternidade uma etapa para ingressar na idade adulta, na medida em que ela incentiva o descentramento, convidando a mulher a ser “responsável por outrem”. Porém, nossa época tem, também, uma visão antinatalista – pode-se recusar toda a descendência em nome da realização de si mesmo. Foi assim que a ideologia “no kid” (sem filhos) tornou-se militante, notadamente na Alemanha. Na era do individualismo, filhos podem significar um triplo obstáculo: à libertação da mulher, a uma vida de casal plena e à realização pessoal. – Mary del Priore.

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A maternidade e a emancipação feminina.

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  1. Pedro

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