Especial TCC: Definindo o objeto de pesquisa

Começa hoje a publicação de uma série de textos desenvolvidos especialmente para os estudantes que estão fazendo seu TCC. O autor é o Professor Doutor Iuri Andréas Reblin. Os artigos serão publicados sempre às quartas-feiras. Aguardamos suas dúvidas e sugestões.

“Tu és responsável pelo que cativas”

Um zilhão de coisas passam pela nossa cabeça quando chega o momento de fazermos o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). Podemos fazer o maior drama e imaginar o quão difícil ou trabalhoso pode ser; podemos nos sentir inseguros e pensar se realmente daremos conta do recado; ou podemos ainda encarar a situação com otimismo e pensar que representa o processo final de um período de formação significativo e também uma etapa do rito de passagem que nos lançará a uma nova etapa, com novos desafios. Independente do que pode passar pela nossa cabeça, fazer o TCC é fascinante, pois é o momento em que nós podemos ensaiar trilhar nosso próprio caminho, desvendar os mistérios que sempre nos chamaram a atenção nos temas que estudamos e, dependendo do orientador ou da orientadora, é possível até ousar e inventar. Em todo o caso, o TCC não é só mais uma monografia de componente curricular. O TCC é a nossa primeira impressão digital no mundo acadêmico, no campo científico da nossa (futura) área de atuação. Por isso, o primeiro passo na realização do TCC é pensar o tema: o que nós, afinal de contas, queremos pesquisar?

Escolher um tema não é uma tarefa difícil, mas também não deve ser executada de maneira descompromissada. Se o TCC é nossa primeira impressão digital no mundo acadêmico, o tema que queremos pesquisar ou o objeto de pesquisa precisa partir de nossos anseios interiores, aquilo que nos cativa, que nos comove, que desperta em nós a curiosidade. Esse é o primeiro ponto para se definir o TCC: ser algo que nos envolve, que nos interessa, que nos instiga à investigação, ou você acha que cientistas passam horas e horas trabalhando, por vezes, passando noites e noites em claro, em suas pesquisas apenas por “obrigação” ou para cumprir “horário”? Não, cientistas passam horas a fio porque estão fascinados pelo mistério que ronda seus objetos de pesquisa. Então, o primeiro critério para se definir um objeto de pesquisa é ir atrás daquilo que cativa você.

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O segundo critério para se definir um objeto de pesquisa, de acordo com Umberto Eco, nos livrinhos intitulados “Como fazer uma tese” e “Como fazer uma tese em ciências humanas” é que o tema não deve ser só interessante para você, mas deve contribuir de alguma forma para a reflexão acadêmica e científica na área. No fundo, quando pensamos no porque de fazer determinadas pesquisas, nós estamos pensando na justificativa. Por que é interessante? Por que é interessante para mim? De que modo seria interessante para outros pesquisadores e outras pesquisadoras da área? De que modo o tema pode ser útil para a comunidade científica ou para a sociedade? O tema pode contribuir no quê? Em maior ou menor escala (dado também o grau de exigência – graduação, especialização, mestrado, doutorado) toda pesquisa sempre contribui em alguma coisa.

O terceiro critério para se definir um objeto de pesquisa, ainda de acordo com Umberto Eco, é realizar uma pesquisa que seja possível de ser realizada. Como assim? Você pergunta. Ora, vamos supor que você quer pesquisar algum aspecto da história política de seu município. E, para tanto, você necessita consultar atas e documentos antigos na prefeitura. Entretanto, você não consegue permissão da prefeitura para consultar esse material historiográfico, quer seja por medida de segurança, quer seja pelo próprio cuidado em relação ao material, por conta da ação do tempo. Assim, por mais interessante que uma pesquisa possa ser, você não tem acesso à fonte que possibilita a sua realização. Portanto, é importante considerar o acesso e a manuseabilidade das fontes, sobretudo, em trabalhos de abordagem histórica.

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Um último critério para a escolha de um tema é o reconhecimento do tema pela comunidade científica enquanto tema válido. De fato, esse é critério sobre o qual nem sempre temos o controle e sobre o qual paira uma disputa política que é chamada por Pierre Bourdieu de “a disputa do campo científico”. Uma determinada comunidade científica precisa reconhecer determinado objeto enquanto objeto válido de pesquisa. Reconhecer isso implica em reconhecer protagonistas em determinados temas ou assuntos, o que pesará na balança do “capital simbólico”. Um exemplo quase clássico: histórias em quadrinhos. Durante muito tempo, as histórias em quadrinhos e as pesquisas que tinhas as histórias em quadrinhos enquanto objeto-fonte foram desprezadas pela comunidade científica. Aliás, não se permitia nem que se pesquisasse sobre histórias em quadrinhos sob a alegação de ser um tema “banal”, “irrelevante”, “cultura de massa”. E pesquisadores e pesquisadoras que se arriscavam a abordar o tema eram motivo de piada. Mas hoje os tempos são outros e as histórias em quadrinhos conquistaram tanto o status de arte, de objeto reconhecível.

Enfim, o primeiro passo para a realização do TCC é a escolha de um objeto de pesquisa, de um tema ou assunto. Esse assunto precisa ser possível de ser pesquisado. Deve contribuir de algum modo para a reflexão na área e, sobretudo, deve ser interessante para você, ser capaz de despertar sua curiosidade e motivar você a ir além. A frase que caracterizou o título desde post remete ao clássico diálogo entre a Raposa e o Pequeno Príncipe, no livro de Antoine de Saint-Exupéry e, no fundo, é essa relação de um cativeiro cativante e de suas consequências que permeia (ou deveria permear) a pesquisa acadêmica saudável. Portanto, hora de escolher seu tema!

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Professor Doutor Iuri Andréas Reblin.

Autor de “Para o Alto e Avante: uma análise do universo criativo dos super-heróis”.

(Porto Alegre: Asterisco, 2008. 128p.)

10 Comentários

  1. Emerson
  2. Ana Paula Silva Câmara
  3. ALESSANDRA ARAUJO
  4. Nádia Narcisa
  5. DJ Neew Dê Loná
  6. Juscelina Silva
  7. Natania
  8. Christiane Costa Lira

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