Por Natania Nogueira.
Uma das reclamações que mais ouço dos meus colegas de trabalho é justamente esta: “Como vamos desenvolver atividades fora da sala de aula sobre memória e história, se não temos museus?”. Ora, não necessariamente temos que ter museus em uma cidade (embora se tivéssemos vários, seria excelente) para trabalhar com memória. Os espaços da memória são muitos e são construídos a partir dos significados que damos a eles.
Segundo Jörn Rüsen, historiador alemão, a história é uma construção humana, um resultado do agir humano. Somos nós que determinamos o valor histórico de um fato ou de um monumento a partir de carências que precisamos saciar. Portanto, o valor de um documento, de um objeto ou de um bem cultural é medido pela importância que ele tem para a comunidade. Somos nós que determinamos o que é histórico ou não é.
Assim, os espaços da memória são aqueles que despertam nosso interesse, que respondem perguntas, que levantam mais questões. Eles podem ser uma rua comercial, onde convivem prédios de arquitetura moderna e antiga; pode ser uma fazenda, com o que restou de um engenho ou de uma senzala; pode ser a escola centenária, que apesar das adaptações arquitetônicas ocorridas ao passar dos anos, ainda guarda memórias de tempos passados, dos alunos que lá estudaram, dos professores que lá trabalharam.
O uso desses espaços é válido a partir do momento em que damos significação a eles. Assim, se o professor quer trabalha educação patrimonial ou história local, em qualquer ano da educação básica ou em qualquer conteúdo (pois a educação patrimonial não deve ser limitada ao ensino de história e aos professores de história), ele vai encontrar no espaço onde vive várias formas de executar essa tarefa.
Em um passeio a uma praça, por exemplo, ele pode efetuar uma série de análises e levar seus alunos a questionaram à importância da memória e da preservação do patrimônio. Algo simples assim, mas que seja bem direcionado, que envolva a atenção. Podemos encontrar vários exemplos de trabalhos bem sucedidos no internet. Não é difícil. Esses trabalhos podem servir de base para aulas e projetos que envolvam educação patrimonial. Mas, acima de tudo, o professor deve estar ciente de que nada pode ser realizado sem que se use da criatividade.
Com relação a isso, é necessário deixar claro que o professor precisa ser criativo o tempo todo. Nos livros de ensino e didática fala-se muito da criatividade do aluno, mas se esquece de que o professor também utilizar esse recurso. Os professores da Educação Infantil e do Ensino Fundamental I para se aproximarem de seus alunos são os que mais utilizam da criatividade nas suas aulas.
Já professores do Ensino Fundamental II, principalmente dos últimos nãos, do Ensino Médio e do Ensino Superior não são estimulados a fazê-lo. Parece que há um preconceito velado contra a criatividade, como se isso infantilizasse o aluno. Ser sério, ser cordato, ser rígido e metódico. É assim que os professores de séries mais avançadas são rotulados. Os alunos não ficam para trás. Muitos inibem sua criatividade porque têm medo de expressá-la frente aos colegas.
Isso fica muito claro nos cursos acadêmicos, voltados ou não para a formação de docentes. O estudante do curso superior não é estimulado a ser criativo. A academia, na maioria das vezes se fecha em teorias e esquece de que é necessário estimular o lado criativo dos alunos, que eles devem conhecer outras formas de pensamento, mas que devem, acima de tudo, desenvolver o seu. Nesse sentido, vejo a importância dos conteúdos ligados à arte e à leitura, que deveriam estar presentes em todos os cursos como uma forma de estimular esse lado do profissional, seja ele destinado ou não ao magistério.
Voltando a Rüsen, o ensino (e a pesquisa) deve ser vinculado ao viver humano, às práticas sociais, ao agir do ser humano. Ora, quando trabalhamos com educação patrimonial isso deve ser mais do que levando em conta. Um ensino que se vincule às necessidades dos alunos, da comunidade onde vivemos, não é uma utopia, nem pode ter sua qualidade medida por avaliações externas, criadas para transformar em números aquilo que só pode ser medido pelas ações.
Rua Barão de Cotegipe, que fica em Leopoldina (MG). Rua comercial que possuí ainda casario do final do século XIX e início do Século XX. Em um passeio com alunos, o professor pode abordar várias questões, que vão desde a formação do núcleo urbano até ações relativas à preservação e depredação do patrimônio histórico.
Olá, Natania!
Os museus são muito importantes na medida em que guardam, protegido, um acervo importantíssimo para a compreensão da História. Bom seria se cada cidade tivesse o seu.
Você tem razão ao dizer que uma simples rua, um pedacinho de parede que seja, pode sim ser um patrimônio histórico.
Temos o exemplo do Arco do Teles e do prédio dos Correios, na Praça XV, no Rio de Janeiro. Impossível passar por ali e não divagar sobre o Império, especialmente sobre o Segundo Reinado.
Fantástico também é o bairro “Lava Pés”, na entrada de Paraíba do Sul, região centro-sul fluminense, caminho importantíssimo de acesso às Minas Gerais, percorrido por Garcia Rodrigues Paes.
Tudo isso, ao ar livre, é uma verdadeira escola.
Ótimo artigo. Parabéns!
Obrigada pelos comentários, Osvaldo! Pois, eu gostaria que toda cidade tivesse um bom museu, que disponibilizasse um grande acervo, mas para aquelas que não tem a criatividade é nosso maior recurso.Nossa cidade pode ser nosso museu, até nossa escola pode se tornar um espaço importante de preservação.