“As Origens do Sexo” – Dica de leitura

A sexualidade humana se resume a um leque de práticas que se organizam em sequências que variam pouco. Mas fazer sexo seria impossível sem um arsenal de ritos e imagens que lhes dão milhares de sentidos. Visível ou invisível, eloquente ou silenciosa, a sexualidade sempre foi objeto de intervenções. E por quê? Pois controlá-la sempre foi controlar as relações sociais. Com a emergência da intimidade, ela se tornou uma forma de “disciplina de si”. E se construiu através de constrangimentos até desaguar no universo público e midiático, quando jornais, gravuras e diários passaram a expor a privacidade das pessoas.

E é disso que trata As origens do sexo – uma história da primeira revolução sexual, em belíssima edição e tradução da Biblioteca Azul, da editora Globo. O cenário é a Inglaterra entre 1600 e 1800. Ali, no início do Renascimento, infidelidade, prostituição e simples fornicação corriam graves riscos. Punições terríveis assustavam: por adultério se perdiam orelhas. Acusados de homoerotismo, sodomia e bigamia eram condenados à morte. A sexualidade era vigiada por Deus e controlada pela comunidade.

Porém, o chamado Iluminismo inglês trouxe mudanças. Na elite, a liberdade sexual ganhou terreno. As mulheres, antes consideradas lúbricas – afinal, filhas de Eva – se tornaram castas. Os homens, antes vítimas do desejo feminino, liberaram geral. Ilustrações de nus e posições sexuais se multiplicaram. Debates sobre a poligamia justificavam-na como um remédio contra a promiscuidade. Um pregador chegou a argumentar que o adultério não seria pecado, se praticado com pureza. E até o filósofo Jeremy Bentham se preocupou com os direitos civis dos “sodomitas”: advogava que eles tinham direito de fazer o que quisessem com seus corpos. O século XVIII individualizou os problemas de consciência e a sexualidade ganhou autonomia. Deixou de ser comunitária para ser particular. O certo e errado não mais se baseavam na Bíblia. A distinção entre público e privado foi reforçada, e a prática do sexo fora do casamento ficou sem punição.

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O que Faramerz Dabhoiwala, professor de Oxford, quer nos dizer é: a revolução sexual dos anos 60, apoiada no aparecimento da pílula não foi novidade. A verdadeira aconteceu dois séculos antes. Diferentes momentos resignificaram a sexualidade vivida ou não como pecado, punida ou não pela lei, considerada ou não um desvio frente à norma. Mas o pêndulo foi e voltou. Ainda há muitos países onde a sexualidade lembra a situação pré-moderna. A história seria, portanto, não triunfalista, como desejam os marxistas, mas circular. E todas essas ideias estão contidas em um livro polêmico, bem escrito e fartamente ilustrado que vale a pena conhecer. – Mary del Priore.

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