“Cultura e Opulência do Brasil”: o veto real

A obra mais conhecida do jesuíta italiano João Antônio Andreoni é “Cultura e Opulência do Brasil“, publicada em 1711, sob o pseudônimo André João Antonil, o “Anônimo Toscano”. A primeira edição foi quase totalmente destruída devido devido ao veto e sequestro régio. Em 1808, frei João Mariano da Conceição Veloso reimprimiu parcialmente o livro. A segunda edição integral foi publicada em 1837. Desde então, várias edições se multiplicam até os dias de hoje, devido ao interesse que o texto desperta ao descrever minuciosamente a economia e a sociedade daqueles tempos.

O livro é dividido em quatro partes, a maior delas é dedicada ao açúcar, e as outras três sobre a criação de gado, o cultivo do fumo  e às minas – as maiores fontes de riqueza da colônia na época. Muito se pesquisou sobre o motivo do veto e do sequestro da obra. Serafim Leite, autor da “História da Companhia de Jesus no Brasil”, afirma que 1711 foi um ano trágico para a colônia. Para ele, o veto foi uma tentativa de Portugal de preservar o território brasileiro do ataque de outras nações.

O Brasil passava por momentos turbulentos naquele ano. A Guerra de Sucessão da Espanha (1700-1713), em que Portugal enfrentava a Espanha e a França, servia de pretexto para ataques sucessivos de Buenos Aires à Colônia do Sacramento. A Guerra dos Emboabas, só terminou no decorrer do ano. Surgiu então a Guerra dos Mascates, entre a aristocracia de Olinda e os negociantes do Recife. E a ainda havia as invasões dos corsários franceses e os conflitos com a França na Amazônia.

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Um fato importante é que, em 1711, foi dada a ordem régia que obrigava todos os estrangeiros e frades a deixarem as minas. A maioria dos autores que estuda a obra aceita a explicação de que o confisco foi motivado pelo assunto tratado: os processos de produção do açúcar e do tabaco, de criação de gado, e ainda as rotas e descrição das minas. Em um momento de tanta instabilidade, nada seria mais impróprio que um livro descrevendo as riquezas do país.

Outras reflexões poderiam ser feitas sobre o sequestro de “Cultura e Opulência do Brasil“. O livro foi editado em Lisboa, com todas as licenças necessárias, tanto civis como eclesiásticas. O veto aconteceu no mesmo ano, por ordem de D. João V, pelo Conselho Ultramarino. Esse trajeto pode ser um indício de que a proibição estaria ligada a uma demonstração de poder, em que o Estado mostraria sua força, sobrepujando a Inquisição. As rixas internas à Companhia de Jesus, especialmente a disputa entre os padres portugueses e os colegas “estrangeiros”, também poderiam ter influenciado o parecer do conselho. Afinal, Andreoni possuía um número considerável de desafetos. São possibilidades que devem ser levadas em conta pelos historiadores, para enriquecer ainda mais os estudos sobre tão importante e controversa obra. – Márcia Pinna Raspanti.

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“Habitantes de Minas Gerais”, de Rugendas.

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